01/10/2006
ANO VI Nº 09,10,11 e 12 Set-Dez 2006
Laboratório Redes de Infraestruturas e Organização Territorial - IPPUR/UFRJ
Coordenação Mauro Kleiman
Equipe:
A Defasagem da Rêde Viária e o Crescimento dos Deslocamentos pelo Modal Automotivo
A recente interdição do Elevado do Joá (em outubro de 2006) revela, novamente, a defasagem existente entre o contínuo aumento do número de veículos automotores e seu fluxo e a configuração da rêde viária no Rio de Janeiro. A rede viária do Rio de Janeiro foi toda reconfigurada a partir do final dos anos 30 do século XX. Estruturada, até então, por um traçado oriundo do período colonial com ruas estreitas e que serviam a deslocamentos a pé e por carruagens, e em seguida serviram como base para a rêde de bondes (a tração animal e depois eletricidade) , a rêde viária a partir do aumento de importação e montagem de veículos automotivos no país desde os anos 1920, e notadamente com a implantação da industria automobilística em 1956, teve que ser reconfigurada para atender o crescente e contínuo movimento de deslocamentos pelo modal automotivo. A opção por deslocamentos automotivos acentuou-se com a extinção do transporte por bondes elétricos e a degradação das investimentos na ferrovia e assistiu-se a vultuosos empreendimentos que modificaram a passagem. Introduzem-se as avenidas de velocidade (Av. Pres. Vargas e Av. Brasil), os túneis urbanos extensos (Santa Bárbara e Rebouças), os cruzamentos em diferentes níveis por viadutos ( Viaduto dos Marinheiros, da Praia de Botafogo, de Madureira, da Penha, entre outros), os Elevados ( da Perimentral, do Joá, Paulo de Frontin), a auto estrada (Lagoa-Barra), até as mais recentes Vias Expressas (Linha Vermelha e Amarela). O Elevado do Joá, cuja interdição total de sua pista superior por problemas de deslizamento de pedras da encosta sobre carros provocou paralisia importante no fluxo de veículos (“Um dia de caos no Joá “- ‘O Globo” 12/10/2006), revela que apesar dos vultuosos investimentos nos últimos 70 anos a rêde viária carece de atualização. A constatação, verdadeira, dos problemas ambientais (referentes a poluição do ar e da questão dos ruídos) tem conduzido em todas as cidades do mundo à busca por um reposicionamento dos deslocamentos por automóvel restringindo-se seu uso nos centros históricos, taxando sua passagem e estacionamentos, e controlando sua velocidade . Contudo, ao contrário das cidades brasileiras, isso é feito aumentando-se as opções de deslocamento através do modal ferroviário seja por metrô, trens e pela reintrodução do Tramway (0 bonde). No Rio de aneiro introduziu-se todo o arsenal de medidas restritivas à circulação automotiva sem a devida ampliação de opções a não ser residuais (relativa ampliação do metrô e melhorias na ferrovia suburbana). Mas mesmos que as opções de outros modais estivessem à disposição, o contínuo crescimento do número de veículos, a expansão da cidade para a zona oeste e a modificação das atividades economicas e do modo de vida não apenas provocaram um aumento dos fluxos nas movimentações superpostas em diferentes direções e horários. O tradicional fluxo pendular casatrabalho- casa com maior intensidade pela manhã e a tarde (a chamada “hora do rush”), dado a um modo de vida com diferentes atividades distribuídas pela família (que incluem compras em shopping, hipermercados, escola ,academias de ginástica, fisioterapia e o trabalho envolvendo pai, mãe, filhos, crianças, netos, sobrinhos e agregados mais os idosos e suas atividades próprias ) e uma economia que fragmenta sua produção por várias unidades, substitui o pêndulo ida e volta único por vários movimentos que superpõem-se e intercruzam-se, acentuando-se o papel do automóvel como elo funcional entre as várias partes do dia-à-dia. O problema é que a acentuação do papel do automóvel e o conseqüente aumento do número de veículos encontra à sua frente uma rêde viária cuja configuração não previu, nem comporta, os movimentos contemporâneos. Estes movimentos exigem complementações, novas soluções, e alternativas com flexibilidades. Algumas vias nos seus projetos iniciais previam determinados ligações que não foram executadas e que no momento atual precisariam ser complementadas. Um dos exemplos mais importantes seria fazer a previsão de ligação entre o túnel Rebouças e a Lagoa por Via Expressa, e mais que urgente a passagem em diferentes níveis de Lagoa-Barra nos cruzamentos hoje feitos por sinais no Leblon (Rua Mário Ribeiro), que fazem parte da rodovia Br-101. Já como exemplo de novas soluções seria uma saída de tráfego da Linha Amarela, não pela Av. Brasil e Linha Vermelha já saturadas, mas por meio de Elevado sobre a Linha de trem da Central do Brasil desde Engenho de Dentro ( o que possibilitaria também implantar tráfego mais rápido de metrô na via férrea) até o Centro; e uma nova via de acesso a Barra ( hoje restrita a Lagoa-Barra) com outros túneis e elevados. A antiga Estrada do Joá e o caminho pelo Alto da Boa Vista não podem ser considerados (como são pela CET-RIO) como alternativas de acesso a Barra pois tratam-se de vias de traçado com acentuados aclives e sinuoso o que não permite tráfego pesado e com velocidade. A Linha Amarela também não é alternativa adequada à Barra, pois atualmente a densidade habitacional e comercial desta área esta concentradíssima no trecho do início da Av. das Américas até a Av. Ayrton Senna, fazendo da Lagoa-Barra a via mais correta e de menor tempo de viagem de acesso a Barra. Não há como não fazer passagens em níveis diferentes de cruzamentos por viadutos ou por passagens subterrâneas, sob a argumentação de restrição ao fluxo de automóveis. Seria preciso igualmente implantar a Linha Azul, via expressa ligando o Recreio a Via Dutra passando pelos bairro de Jacarepaguá criando um eixo de movimentação entre a Baixada Fluminense e a área de expansão do Rio e um novo acesso a metrópole. Seria urgente introduzir também, a idéia de vias com flexibilidaddes de utilização a partir da contagem eletrônica de veículos por hora e de intra e inter-vias (maior aumento de ligações hoje com momentos de bloqueio os carros não encontram saídas para retornar ou buscar outras vias); o pedágio urbano deveria ser contado também eletrônicamente, e o pagamento ser feito por boletos ou no cartão de crédito e não manualmente ( no mínimo o pedágio da Linha Amarela deveria ser em um só sentido). Quando os governos utilizam apenas de uma política regressiva e repressiva para o modal automotivo não estão percebendo ( ou não querem perceber) que o papel do automóvel como elo funcional para o modo de vida e a economia atual acentuou-se. Assim sendo, não poderiam eximir-se de uma política de investimentos em novas situações viárias, ainda mais que, apesar dos discursos, ainda pouco avança-se em investimentos no modal ferroviário, que como transporte de massa seria a verdadeira revolução no Rio de Janeiro.
Mauro Kleiman