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Chão Urbano

Chão Urbano ANO IV Nº 02 Abril 2004

01/04/2004

Integra:

ANO IV Nº 02 Abril 2004

  

Laboratório Redes de Infraestruturas e Organização Territorial - IPPUR/UFRJ  

 

      Coordenação Mauro Kleiman  

 

       Equipe:  Genivaldo Henrique Silva dos Santos, Simone Cavalcanti do Amaral

 

 

 

Rio de Janeiro: Metrópole

Sem Transporte Metropolitano

 

A metrópole do Rio de Janeiro, 2º pólo econômico, social, político e demográfico do país, composta por dezessete municípios, contando com quase onze milhões de habitantes, não possui uma política de transportes. Nó de fluxos de deslocamentos, trocas, produção, comércio, serviços, a metrópole do Rio de Janeiro, para além de seus limites político-administrativos apresenta eixos de articulação importantes em várias direções que alargam sua área de influência. Assim, tem-se fortes fluxos tanto com as cidades da Região das Baixadas Litorâneas (Região dos Lagos) e Centro- Fluminense (Região Serrana), como com a Região Sul Fluminense (Costa Verde), não apenas no finais de semana, feriados e temporada de verão, quando a metrópole como que “estica-se” para suas cidades, mais também nos dias úteis verifica-se intensa articulação apontando para uma elasticidade do território metropolitano.Acresce-se à estes fluxos aqueles de maior distância com o pólo industrial (principalmente automobilístico) de Resende/Porto Real (também no Sul Fluminense, mas localizado no Vale do Paraíba), e mesmo com o pólo petrolífero de Campos/Macaé, que depende da metrópole do Rio, sede das decisões da Petrobrás; dos portos de escoamentos do óleo para o exterior; do tráfego aéreo internacional; das comunicações. Aos fluxos externos deve-se apontar para a atual complexidade dos padrões de deslocamentos intra-metrópole. O conhecido padrão pendular moradia-trabalho / bairro-centro foi totalmente rompido: observam-se deslocamentos da grande massa de menor renda da periferia próxima e distante para diferentes sub-centros (tanto à Oeste para a Barra da Tijuca / Jacarepaguá / Recreio, como para subúrbios Méier/Madureira; como para a Zona Norte – Tijuca/Vila Isabel; Zona Sul Copacabana / Ipanema / Leblon), e também para o centro; deslocamento inter e intra-periféricos; deslocamentos da camada de maior renda intra - sub- centros, e ainda com o centro; deslocamentos  interbairros e intra-bairros o que configura fluxos cruzados internos em todas as direções, e acontecendo ao longo de todo o dia, e não mais apenas em determinados momentos pela manhã e ao anoitecer (embora mantenham-se estes momentos como horários de “pico”.). A questão que coloca-se é que à magnitude e dinâmica da metrópole, e à complexidade, intensidade dos seus fluxos, inexiste uma política de transportes e os deslocamentos são feitos calcados  majoritariamente pelo modal automotivo. Tem-se uma formidável prevalência do transporte automotivo pois estima-se que 90,28% dos deslocamentos são feitos por ônibus ( 75,26%) e vans ( 15,02%). São 14779 ônibus na RMRJ ( sendo 10728 municipais e 4501 intermunicipais) e 1118 microônibus (sendo 994 municipais e 124 intermunicipais). Deve-se acrescer à frota automotora a estimativa de 1.600 vans sendo cerca de 5000 a 8500 clandestinos. Ainda deve-se somar a esta frota evidentemente o número de 2500000 automóveis em circulação no estado do Rio de Janeiro, sendo na RMRJ cerca de 2000000. Para completar-se o quadro absoluto do predomínio do modal automotivo sobre os demais, observou-se que apenas 9,03%  dos deslocamentos são feitos por ferrovia- 5,04 % por metrô( com 41 estações em 2 linhas) e 3,99% por trens urbanos ( apesar de ter extensa rede de cerca de 360 km cobrindo eixos da RMRJ, grande parte eletrificada); e apenas 0,70% dos deslocamentos são feitos por modal aquaviáriobarcas. A tendência do privilegiamento do modal automotivo tem sua raiz na instalação de indústrias automobilísticas na 2ª metade da década de 50 no século XX. Apesar de já na primeira metade do século XX verificar-se importações de automóveis, caminhões e ônibus, o transporte no Rio de Janeiro tinha na rede de bondes - uma das mais extensas do mundo com 420km cobrindo toda a cidade- e nos trens urbanos- seus principais meios de deslocamento. Com a  pressão da industria automobilística e dos governos, já na década de 60 do século XX extingue-se as linhas de bondes e começa um processo de esvaziamento/sucateamento das linhas de trens e aumenta-se substancialmente os investimentos na reforma e ampliação da rêde viária urbana com construção de extensos túneis urbanos (com 2,5km) cortando transversalmente a cidade (então compartimentada pelas montanhas o que fazia a passagem pelo centro-histórico obrigatório em todos os deslocamentos inter-bairros); vias elevadas, viadutos, park-ways, vias expressas,... atraindo cada vez mais veículos automotores. A inexistência de políticas de transporte urbano e metropolitano ( no bojo da ausência de planejamento urbano e metropolitano), dentro de uma perspectiva de investimentos e coordenação intermodal e desestímulo ao transporte individual ( encontrado nos países centrais), aumentaram o desequilíbrio existente entre o transporte individual e o coletivo, sendo este realizado por um sistema de ônibus, microônibus, kombis e vans que não consubstancia-se como transporte de massa, que seria por meio ferroviário – trens e metrô. Tem-se assim uma inversão pois o que deveria ser auxiliar ao sistema de massa tornou-se o principal, sendo o trem e o metro auxiliar do transporte automotivo. Isto acarreta tempos de viagem muito alongadas ( estima-se que a população da periferia gaste cerca de pelo menos 4hs/dia nos deslocamentos), custo alto das viagens; congestionamentos diários em várias partes da metrópole. Entre as várias funções no território os deslocamentos estão entre aquelas de característica mais intrinsecamente metropolitana, pois aos fluxos os limites geo-políticos não importam e sim a articulação entre atividades e pessoas, bens, serviços, sejam onde estiverem e para onde devem dirigir-se. Assim sendo, deveríamos ter no Rio de Janeiro a constituição de uma política de transportes metropolitanos, com uma agência com autoridade sobre este âmbito territorial, e não a fragmentação e a separação estanque existente entre municípios. Atualmente tem-se, além disso, apenas o aspecto fiscalizatório das concessões e dos veículos, e o controle dos preços das passagens, mas não um pensamento e ação planejadora e decisória sobre uma política que repense os fluxos e deslocamentos como um todo, e que procure apontar para o transporte de massa, para uma intermodalidade, e para um conseqüente reposicionamento do lugar do transporte automotivo por ônibus, vans e kombis, e um uso mais seletivo do automóvel particular.

Mauro Kleiman

 

 

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