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Chão Urbano

Chão Urbano ANO VIII – N° 1 JANEIRO / FEVEREIRO 2008

01/01/2008

Integra:

ANO VIII – N° 1  JANEIRO / FEVEREIRO 2008

Editor

Mauro Kleiman

 

Publicação On-line

Bimestral

 

Comitê Editorial

• Mauro Kleiman

• Márcia Oliveira Kauffmann

• Maria Alice Chaves Nunes Costa

• Viviani de Moraes Freitas Ribeiro

• Juliana Marques da Silva

 

IPPUR / UFRJ

LABORATÓRIO REDES URBANAS

LABORATÓRIO DAS REGIÕES METROPOLITANAS

Coordenador Mauro Kleiman

 

Equipe

Aline Alves Barbosa da Silva, Juliana Marques da Silva, Simara Guzzo Elias, Priscylla Conceição

Guerreiro dos Santos

 

Pesquisadoras associadas

Márcia Oliveira Kauffmann, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviani de Moraes Freitas Ribeiro.

 

Artigos

 

Em busca de soluções aos constrangimentos à mobilidade espacial no Rio de Janeiro.

Mauro Kleiman

 

Planejamento urbano e de recursos hídricos articulados: ainda hoje um desafio.

Márcia O. Kauffmann

 

Em busca de soluções aos constrangimentos à mobilidade espacial no Rio de Janeiro

Mauro Kleiman

 

Deslocar-se de  um  ponto  a  outro para o exercício das diferentes atividades do  dia-a-dia tem  encontrado constrangimentos  crescentes  nas metrópoles  do  país.    Os  deslocamentos no  território brasileiro, em suas diferentes  escalas,  fazem-se  majoritariamente  pelo transporte  automotivo.  Configurou-se, assim, uma  dependência  para  os movimentos de circulação, principalmente ao  automóvel  particular  e  ao  ônibus  em detrimento  do  transporte  de  massa ferroviário.  Como  conseqüência  a questão  da  mobilidade  espacial,  tomada como  importante  recurso  social,  estará articulada  às  possibilidades  e  aos constrangimentos  dados  pela  renda  de cada camada social. Assim sendo será no poder  de  compra  e  de  manutenção  do veículo  automotor  que  se  guarda  o  nexo com entre a possibilidade de movimentos de  circulação  e  deslocamentos  para  a camada  de  renda  mais  alta,  e  os constrangimentos  e  até  mesmo  a  total impossibilidade  de mobilidade  para  a  de baixa renda. No caso do Rio de Janeiro a situação  agrava-se  ainda  mais,  pois 94,2% dos deslocamentos são feitos pelo modal  automotivo,  sendo  menos  5,2% feito pelo transporte de massa pelo modal ferroviário (PDTU 2003).

Os  deslocamentos  por  automóvel particular  representam  17%  do  total,  e  a este  somam-se mais 4%  de  táxis,  sendo a  frota  total    da  ordem  de  2000000  de veículos.  O  gasto  de  tempo  médio  de viagem para o usuário de baixa renda que usa  o  ônibus  ou  vans  vai  de  2hs  a 4hs/dia! (PDTU 2003). Quanto mais tenha menor renda, e habite a periferia, maior o tempo  de  viagem  e  o  gasto  em passagem,  sendo  que  muitas  vezes  o trajeto casa – trabalho – casa exigirá uma ou mais baldeações.

Análise  qualitativa  que desenvolvemos  mostra  que  certas localidades  de  baixa  renda  apresentam índices  de  imobilidade,  ou  seja,  as pessoas  não  têm  acesso  a  transportes nas  proximidades,  ou  se  tem,  não  tem renda  suficiente  para  utilizá-los.  Existem também registros de deslocamentos a pé, seja para chegar até um local onde tenha ônibus  ou  vans,  ou  mesmo  para  fazer todo  um  trajeto  diário  casa  –  trabalho  – casa  ou  para  escolas,  compras,  etc. (esses índices variam muito, mas estudos apontam  para  algo  entre  15%  a  33%. PDTU  2003;  IBOPE  2007).  Viagens através  de  mototaxis  têm  evoluído ultimamente  na  ligação  dos  bairros  com favelas  e  outros  municípios  com loteamentos  periféricos  (0,8  %  das viagens/dia; PDTU - 2003).

Uma  das  expressões  mais importantes  do  uso  hiper-intenso  do automóvel para os deslocamentos são os cada vez mais freqüentes consentimentos em toda hora do dia, em todas as regiões da metrópole. Não existe mais a chamada “hora  de  pico”,  ou  “hora  do  rush”,  como eram  denominados  os  momentos  de deslocamento pendular pela manhã (casa – trabalho), e pela tarde (trabalho – casa), e  sim  se  observa  que  esses  momentos repetem-se várias vezes ao  longo do dia, e em todas as direções. 

Como  os  investimentos  em transporte de massa são  reduzidos, para reverter a opção automotiva de transporte individual, a metrópole do Rio de Janeiro paga um alto custo social pelos entraves à fluidez dos deslocamentos. Mas mesmo tendo em vista que a mobilidade depende do automóvel particular, dos ônibus, vans e  motos,  não  se  observa  a  busca  de soluções  planificadas  para  resolver  a situação.  Como  existe  a  dependência automotiva,  e  que  cada  vez  acentua-se mais  (inclusive  pela  ampliação  da fabricação  de  automóveis  no  país)  seria preciso implantar-se uma política geral de mobilidade na metrópole.

O  Plano  Diretor  de  Transportes Urbanos  (PDTU)  é  um  caminho  nesta direção,  mas  algumas  soluções,  mais inovadoras  que  têm  sido  aplicadas  (por exemplo,  em  São  Paulo),  para  a  fluidez do  tráfego  tanto quanto a automóveis ou ônibus  sequer  chegaram  ao  Rio  de Janeiro. Em geral o que se tem no Rio é a aplicação  do  que  se  pode  denominar  de política  regressiva,  ou  seja,  medidas  de impedimento  ou  encarecimento  para deslocamento  de  todos  os  tipos  de veículos  automotores.  Recentemente (Maio  de  2008),  os  caminhões  de entregas  passaram  a  ter  um  âmbito espacial  entre  determinados  horários  no qual não podem trafegar (“Caminhão aqui não”; “Entrega só de multas” - O Globo 26 de  Abril  e  6  de Maio  de  2008).  Esta  foi uma medida  restritiva, cujo  resultado  tem sido  uma  maior  fluidez  do  tráfego, melhorando  as  condições  de deslocamentos.  Porém  trata-se  de  mais uma medida  restritiva de caráter pontual, que  em  sendo  adotada  num  conjunto planificado de soluções teria melhor efeito e  compreensão  por  parte  dos  agentes atingidos.

Diante  da  inevitabilidade  do crescimento  quantitativo  de  veículos automotores  deveria  pensar-se  numa política viária para a metrópole do Rio de Janeiro.  Alguns  elementos  desta  política podem ser elencados a título de reflexão: É  necessário  (e  urgente) repensar  a  engenharia  de tráfego,  porque  ainda persiste  uma  solução  de antes  do  “choque  do petróleo”  dos  anos  1970, que  era  de  fazer  o  transito fazer  longínquos  percursos e  retornos  para  atingir determinados  pontos  (ou “balão”  ou  “giro”,  como  se diz  em  São  Paulo)  na tentativa  de  evitar determinados  cruzamentos já  muito  congestionados. Acontece  que  desde  os anos  70  o  número  de veículos  cresceu geometricamente,  e  depois estamos  diante  de  novo “choque  do  petróleo”  que elevará  o  preço  do combustível.  Seria  preciso voltar  a  se  pensar  em construir  viadutos,  ou passagens  subterrâneas, para  eliminar  cruzamentos que  já  não  tem  (há  muito tempo)  como  serem controlados  apenas  por sinais  para  dar  vazão  ao tráfego. Com a solução dos anos  70  ruas  residenciais passaram  a  ser  ruas  de tráfego  pesado  e  fica-se fazendo um enorme número de  veículos  dando  voltas para chegar a um ponto que com  viadutos  estariam muito  próximos.  Por  outro lado,  a  engenharia  de tráfego  deve  voltar-se também  para  as  áreas  de crescimento  imobiliário  da metrópole,  antes  zonas  de menor  número  de  veículos onde  as  soluções  de transito não foram alteradas diante  da  nova  situação  de seu  crescimento.  Nestas áreas também deveriam ser feito viadutos.

•  Dever-se-ia reativar  a  idéia  dos  pontos de  transbordo de cargas de grandes  caminhões  para veículos  de  menor  porte nas  rodovias  de  acesso  a metrópole,  e  criar-se  locais de  estacionamento  destes caminhões  menores  em cada  bairro,  de  onde  as cargas  chegariam  ao  seu destino  em  pequenos carros  (por  exemplo, elétricos)  que  seriam distribuidores,  pois  o  que ocorre  hoje  é  que  os caminhões  querem  parar cada  qual  na  porta  dos estabelecimentos aos quais tem entregas  a realizar.

•  À  idéia  de faixas seletivas para ônibus o  Rio  deveria  seguir  o exemplo  de  São  Paulo  e adotar  um  plano  de  vias expressas  para  estes veículos,  ou  seja,  vias bloqueadas,  separadas  dos demais  fluxos,  incluindo viadutos  para  vencer cruzamentos  e  que ligassem as várias zonas da cidade  entre  si  e  com  o centro.  O  prometido corredor  T5  para  ônibus entre  a Barra  e  a Penha  já deveria  ser  nestes  moldes de  via  expressa,  e preverem-se  outros  para  a metrópole.

•  Seria interessante  a  construção de  novas  vias  expressas para  automóveis:  (a)  uma extensão  importante seria a da  Linha  Vermelha  até  a Zona  Oeste  do  Rio;  (b) fazer  uma  saída  em elevado  da  Linha  Amarela para o Centro sobre a  linha da Estrada de  ferro Central do  Brasil,  pois  a  Avenida Brasil  e  a  Linha  Vermelha não  suportam  mais  o  fluxo de veículos vindos da Zona Oeste  em  expansão.  (c) voltar  à  idéia  inicial  da  Av. das  Américas  como  via expressa  com  passagens subterrâneas  para cruzamento  de  veículos  e pessoas,  ficando  as  vias laterais para tráfego local; e concluir  a  Via  Parque  e  o restante  do  Sistema  da Barra  da  Tijuca;  assim como  ligar a Linha Amarela à Taquara em via expressa; (d)  construir  a  Linha  Azul ligando  o  Recreio  dos Bandeirantes  à  Via  Dutra em  via  expressa, fundamental para completar a  ligação  de  área  de expansão da cidade.

 Enfim,  o  Estado  não  pode  eximir- se  de  buscar  soluções  para  permitir  a mobilidade  populacional  espacial  na metrópole  do Rio  de  Janeiro  sob  o  falso argumento  que  os  veículos  automotores seriam  “inimigos”  da  sustentabilidade,  na medida em que ele mesmo estimula  sua crescente  produção  e  não  investe  em outros modais. 

 

 

 

 

 

Planejamento Urbano e de Recursos Hídricos Articulados: ainda hoje um desafio

Márcia O. Kauffmann

 

Diversos  impactos  negativos  e significativos ao meio ambiente  resultam, quase  sempre,  dos  processos  de ocupação do solo urbano, principalmente quando  a  rápida  expansão  e  o inchamento  de  regiões  em megacidades estão  ainda  associados  a  práticas  de planejamento  inadequadas  ou insatisfatórias  para  a  garantida  de qualidade de vida nas cidades. 

A  preocupação  com  o  ambiente urbano,  especialmente  em  relação  à salubridade,  já  ao  final  do  século  XIX, com o advento da Revolução Industrial, e o  início  de  um  processo  acelerado  de crescimento  urbano  e  populacional, motivou o estudo desta problemática e o surgimento de novas disciplinas tais como o Urbanismo. Normas de controle de uso e  ocupação  das  cidades  foram  sendo elaboradas,  floresceram  diversas correntes  de  pensamento  e  de planejamento  urbano  que  acabaram  se traduzindo  também  em  legislação urbanística. 

Entretanto,  o  enfoque,  atualmente óbvio,  associando  a  questão  do desenvolvimento  urbano  à  questão ambiental  é  relativamente  recente. Originou-se  de  discussões,  por  volta  da década  de  60,  de  técnicos  e  cientistas ligados  ao  tema  ambiental,  sobre  as ações  antrópicas  negativas  impostas  ao meio  ambiente,  especialmente  nas últimas  décadas.  Desde  então  as questões  ecológicas  foram  assumindo caráter  interdisciplinar,  e  proporções mundiais.  A  Conferência  de  Estocolmo, em  1972,  foi  um  importante  avanço  em termos  de  estratégias  para  um desenvolvimento  sócio-econômico eqüitativo,  denominado  Desenvolvimento Sustentável,  em  1987,  a  partir  da publicação  do  relatório  "O  Nosso  Futuro Comum"  (também  conhecido  como Relatório  Brundtland),  de responsabilidade  da  Comissão  Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento pela Assembléia  Geral  das  Nações  Unidas. Este  documento  identificou  os  principais problemas  ambientais  que  travam  o desenvolvimento de muitos países do Sul e  estabeleceu  o  ambiente  como prioridade  internacional,  lembrando ainda pela  primeira  vez,  de  uma  forma  mais consistente,  que  a  humanidade  deve preservar  os  recursos  naturais  para  as gerações  futuras. Mais  tarde a expressão “Desenvolvimento  Sustentável”  seria amplamente  divulgada  a  partir  da  ECO 92, conferência mundial sobre ecologia e desenvolvimento,  realizada  no  Rio  de Janeiro.  

Considera-se, hoje, que as normas relacionadas  à  ocupação  das  cidades  e seu  desenvolvimento,  com  qualidade  de vida  e  em  harmonia  com  o  meio ambiente,  devem necessariamente  (além dos  parâmetros  urbanísticos,  destinados a  controlar  densidade  e  volume  das construções, área livre dos lotes e demais limitações  ao  uso  e  ocupação  do  solo urbano)  contemplar  aspectos  ambientais incluindo os especificamente relacionados aos  recursos  hídricos.  Principalmente porque, dentre os impactos resultantes da urbanização  destacam-se  os  resultantes da  impermeabilização  dos  solos, diretamente  relacionados  às  águas urbanas.  HALL  (1984),  entre  outros autores,  tem  abordado  os  efeitos  das ações  antrópicas  negativas  ao  meio ambiente,  relacionando  o  processo  de urbanização,  o  aumento  das  áreas impermeabilizadas  dos  solos  das  bacias hidrográficas  e  a  ocupação  de  margens de rios e de encostas com a  interferência nos  processos  hidrológicos,  contribuindo para  o  agravamento  de  inundações  e dificultando  a  manutenção  dos ecossistemas  naturais  hídricos,  além  do aumento  da  poluição  e  outros  impactos indiretos.

Na  busca,  portanto,  da  gestão integrada  dos  recursos  hídricos  com  o planejamento  urbano  a  atual  legislação brasileira  já vem desenvolvendo diversos procedimentos  e  recomendações.  Tais regulamentações  encontram  amparo  na Constituição  Federal  de  1988  que estabelece  as  diretrizes  gerais  e  as competências  específicas  dos  poderes: nacional  (União),  regional  (Estados)  e local  (Municípios  e  Distrito  Federal) também  para  as  questões  urbanas, especialmente  nos  artigos  182  e  183, destacando  a  competência  do  Poder Público  Municipal  para  a  execução  da política  de  desenvolvimento  urbano,  e que  no  Capítulo  VI  trata  do  Meio Ambiente  assegurando  no  artigo  225  o direito  a  todos  “ao  meio  ambiente ecologicamente  equilibrado”  e  impondo ao  “Poder  Público  e  à  coletividade  o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes  e  futuras  gerações”.    A  Carta Magna contempla ainda alguns conceitos presentes no Código das Águas de 1934, ainda em vigor, principalmente no que se refere  à  propriedade  social  dos  recursos hídricos,  como  se  verifica  no  artigo  20 que  trata  dos  bens  da  união,  entre  eles “os  lagos,  rios  e  quaisquer  correntes  de águas” nas situações que especifica e “os recursos  minerais  inclusive  os  do subsolo”; e ainda no seu artigo 26, onde se  incluem  como  bens  dos  Estados  “as águas  superficiais  ou  subterrâneas,   8 efluentes,  emergentes  e  em  depósito”. Mais  recentemente  somou-se  a  estas normas  o  Estatuto  da  Cidade,  Lei  Nº 10.257  de  10/07/2001  que  estabeleceu diretrizes  gerais  para  a  política  urbana  e para  a  elaboração  e  implantação  dos Planos  Diretores;  regulamentou  a aplicação  de  instrumentos  destinados  a conferir uma  função  social à propriedade urbana,  explicitando  ainda  o  conceito  de sustentabilidade  como  justiça  social  e ambiental (MEDAUAR, 2002).

Verifica-se  ainda  a  intenção  da articulação  entre  os  planejamentos urbano e de recursos hídricos nas normas municipais,  como  por  exemplo,  na  Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro de 1990 especialmente na recomendação da  “adoção  das  áreas  de  bacias  e  sub-bacias  hidrográficas  como  unidades  de planejamento  e  execução  de  planos, programas e projetos” entre outros meios para  assegurar  o  devido  controle  e preservação do meio ambiente. No Plano Diretor  Decenal  da  Cidade  do  Rio  de Janeiro de 1992, (ainda hoje em processo de  revisão)  tais  preocupações  estão também  contempladas  no  artigo  129 inciso  XII  que  destaca  a  “realização  de estudos  por  bacias  hidrográficas,  para determinação  de  taxa  de impermeabilização  do  solo,  a  fim  de subsidiar  a  elaboração  de  plano  de macrodrenagem  e  da  legislação urbanística” (CMRJ, 1992 e 1996). 

Em Niterói  o Plano Diretor,  Lei Nº 1.157  de  29/12/92  (NITERÓI,  1992) também  busca  esta  integração, especialmente  na  divisão  do  município em  cinco  regiões,  segundo  critérios  de homogeneidade e  relacionadas com sub-bacias  hidrográficas  e  ainda  na  previsão no artigo 71 do “detalhamento das bacias e  sub-bacias  de  drenagem  em  todo  o território  municipal”  (inciso  I);  da “definição  de  índices  de impermeabilização  para  cada  bacia,  que sirvam  de  parâmetro  para  uso  e ocupação  do  solo”  (inciso  IX)  e  de “estudos  para  definição  de  vazões específicas” (inciso X). 

No  caso  da  Região  Metropolitana de  São  Paulo  acontece  a  pertinência entre a mancha urbana e a Bacia do Alto Tietê,  o  que  permite  o  desenvolvimento de diversos aspectos da gestão integrada (TOLEDO  E  SILVA,  2003).  Por  outro lado, as áreas desta bacia e de suas sub-bacias  não  coincidem  com  os  limites municipais,  para  os  quais  se  aplica  a legislação urbanística.   

Dentre os estudos e propostas que já  vêm  sendo  realizados,  no  sentido  da maior  articulação  entre  o  planejamento urbano  e  gestão  dos  recursos  hídricos, destacam-se os recursos de detenção de águas  pluviais  em  contrapartida  à impermeabilização  dos  solos, especificando  inclusive,  na  legislação   9 urbanística  índices e parâmetros  técnicos necessários  a  um  melhor  controle  da ocupação  urbana,  conforme apresentados  em  TUCCI  (2001)  para  as cidades de Curitiba (também FENDRICH, 2005),  Belo  Horizonte  e  Porto  Alegre. Algumas  cidades  contam  ainda,  nas normas, nos planos diretores e legislação urbanística  com  exigência  de definição  e adoção  de  parâmetros  urbanísticos diretamente  relacionados  às  águas urbanas.     

A  taxa  de  solo  natural,  bem  como estudos  de  vazões  específicas,  de drenagem  e  do  relacionamento  do zoneamento  às  sub-bacias  hidrográficas são  também preocupações contempladas na  revisão  do  Plano  Diretor  de  Recife (RECIFE,  2002).  Semelhantemente, também no Rio de Janeiro, na elaboração de,  especialmente  a  partir  de  2004, diversos Projetos de Estruturação Urbana - PEUs (por exemplo, PEU Taquara; PEU Campo  Grande;  PEU  São  Cristóvão  e PEU  das  Vargens)  foram  contempladas, de  certa  forma,  algumas  questões associadas  aos  recursos  hídricos  tais como  o  estabelecimento  de  taxas  de permeabilidade,  entretanto  não  ainda diretamente  relacionadas  a  bacias hidrográficas,  conforme  proposto  em KAUFFMANN  e  PIMENTEL  DA  SILVA (2005). 

No que se refere à Lei nº 9.433, de 08.01.97  que  institui  a  Política  Nacional de  Recursos  Hídricos  e  cria  o  Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos  tais  proposições  estão explicitadas  no  artigo  1º,  inciso  IV,  onde afirma  que  a  “bacia  hidrográfica  é  a unidade  territorial  para  a  implementação da  Política  de  Recursos  Hídricos  e atuação  do  Sistema  Nacional  de Gerenciamento  de  Recursos  Hídricos”  e no  artigo  3º  inciso  V  que  propõe  como diretriz  geral  de  ação  “a  articulação  da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo” (MEDAUAR, 2002).

A  bacia  hidrográfica  se  qualifica então  como  a  unidade  de  planejamento adequada à gestão  integrada, permitindo objetivamente  o  tratamento  da  ocupação urbana da bacia. Entretanto, na prática do planejamento  urbano,  esta aparentemente  simples  solução  se complica na medida em que as áreas de planejamento,  os  zoneamentos,  as divisões e subdivisões administrativas por regiões  e  bairros  comumente  não guardam  correspondência  com os  limites das  bacias.  O  desenvolvimento  de parâmetros  urbanísticos  (bem  como  o estudo  dos  existentes)  diretamente relacionados  à  realidade  física  da  bacia tais  como  a  taxa  de  impermeabilização dos  solos  (KAUFFMANN,  2003),  pode favorecer e viabilizar esta articulação que,   10 ainda  hoje  no  Brasil,  se  apresenta  na prática como um desafio. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CMRJ. Lei Orgânica do Município do Rio de  Janeiro.  Rio  de  Janeiro,  a.  Câmara, 1992. CMRJ. Plano Diretor Decenal  da Cidade do Rio  de  Janeiro.  2ªed. Rio  de  Janeiro, a. Câmara, 1996.

FENDRICH,  R.  “Economy  of  drinking water  by  the  use  of  detention  and rainwater  utilization  systems”.  In: Sustainable Water Management Solutions for  Large  Cities  (Proceedings  of symposium  S2  held  during  the  Seventh IAHS  Scientific  Assembly  at  Foz  do Iguaçu,  Brazil,  April  2005).  IAHS  Publ. 293, 2005, 155-163.

HALL, M.  J., Urban Hydrology, Belfast  – Ireland, Elsevier Ltd., 1984. 

KAUFFMANN, M. O. Expansão Urbana e Qualidade  de  Vida:  Proposta  para Desenvolvimento  de  Indicadores  de Sustentabilidade  Aplicados  à  Legislação Urbanística. Rio de Janeiro, Mestrado em Engenharia  Ambiental  da  UERJ, dezembro 2003. Dissertação.

KAUFFMANN,  M.  O.  e  PIMENTEL  DA SILVA, L. “Taxa de Impermeabilização do Solo: Um Recurso para a  Implementação da  Bacia  Hidrográfica  como  Unidade  de Planejamento Urbano Integrado à Gestão dos  Recursos  Hídricos”.  In:  XI  Encontro Nacional da ANPUR, Salvador, BA, 2005.

MEDAUAR,  Odete  (org.).  Constituição Federal.  Coletânea  de  Legislação Ambiental.  São  Paulo,  Editora  Revista dos Tribunais, 2002. NITERÓI,  Plano  Diretor  de  Niterói,  RJ, 1992. Em:<http://www.niteroi.rj.gov.br>,13/02/05.

RECIFE,  Plano  Diretor  do  Recife,  PE, 2002.  Em:<  http://www.recife.pe.gov.br>, 13/02/05.

TOLEDO  E  SILVA,  R.  de.  “Gestão Metropolitana  de  Águas  Urbanas”.  In: Workshop  A  Questão  da  Água  nas Grandes Cidades Brasileiras, São Paulo, SP, 2003. 

TUCCI,  C.E.M.  Gerenciamento  da Drenagem  Urbana  (artigo  submetido  à Revista Brasileira de Recursos Hídricos). Porto Alegre, RS, 2001.

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