05/01/2024
Chão Urbano Ano XXIII N º 2 MARÇO-ABRIL DE 2023
Editor
Mauro Kleiman
Publicação On-line
Bimestral
Comitê Editorial
Mauro Kleiman (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)
Márcia Oliveira Kauffmann Leivas (Dra. Em Planejamento Urbano e Regional) Maria Alice Chaves Nunes Costa (Dra. Em Planejamento Urbano e Regional) – UFF Viviani de Moraes Freitas Ribeiro (Dra. Planejamento Urbano e Regional IPPUR/UFRJ) Luciene Pimentel da Silva (Profa. Dra. – UERJ) Hermes Magalhães Tavares (Prof. Dr. IPPUR UFRJ) Hugo Pinto (Dr. Em Governação, Conhecimento e Inovação, Universidade de Coimbra – Portugal)
Editora Assistente Júnior
Jenny Carla Gomes Ramos
IPPUR / UFRJ
Apoio CNPq
LABORATÓRIO REDES URBANAS LABORATÓRIO DAS REGIÕES
METROPOLITANAS
Coordenador
Mauro Kleiman
Equipe Jenny Carla Gomes Ramos
Pesquisadores associados
André Luiz Bezerra da Silva, Audrey Seon, Humberto Ferreira da Silva, Márcia Oliveira Kauffmann Leivas, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviane de Moraes Freitas Ribeiro, Vinícius Fernandes da Silva, Priscila Loretti Tavares.
ONDE SÃO INSERIDAS AS NOVAS INFRAESTRUTURAS?
As principais pontes preexistentes para a conexidade entre Salvador e o entorno da Baía de Todos os Santos.
Isabel Aquino e Silva
Urbanista (UNEB), Bacharela Interdisciplinar em Humanidades (IHAC/UFBA), Especialista em Planejamento Urbano e Arquitetura e mestranda em Planejamento Urbano e Regional pelo Instituto de Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ).
RESUMO
Este artigo aborda a proposta de construção da Ponte Salvador-Itaparica, sobre a Baía de Todos os Santos, como parte de um macroprojeto de infraestrutura viária, o Sistema Viário do Oeste, no Estado da Bahia. O estudo se concentra na análise das principais infraestruturas pré-existentes na região Metropolitana de Salvador e Recôncavo que se articulam com o projeto da ponte. Para isso, busca elencar as principais pontes históricas, ferroviárias e rodoviárias, abordando detalhes sobre suas construções, contexto histórico e impactos sobre a mobilidade urbana. O estudo traz uma crítica ao discurso desenvolvimentista associado ao projeto da Ponte Salvador-Itaparica ao ressaltar a necessidade de questionar a real demanda e a escolha exclusiva pelo modo rodoviário de transporte.
Palavras-chave: pontes, macroprojeto, infraestrutura de transporte, desenvolvimento urbano e regional.
ABSTRACT
This paper examines the proposal to build the Salvador-Itaparica Bridge, over the Baía de Todos os Santos, within the context of a large-scale roadway infrastructure project, the West Road System (SVO), in the State of Bahia, Brazil. The research focuses on assessing the main infrastructure facilities that already exist in the Metropolitan area of both Salvador and the Recôncavo region in Bahia, under the scope of the bridge construction proposal. To that end, the paper looks at the state’s main bridges, railroads and highways and brings detailed information on their construction, historical context and impact on urban mobility. Finally, it critiques the developmentalist discourse entailing the Salvador-Itaparica Bridge upon stressing the need to question the actual demand and sole choice for the roadway transport system.
Keywords: bridges, large-scale project, transport infrastructure, urban and regional development.
INTRODUÇÃO
Sobre as águas da Baía de Todos os Santos, delineia-se um macroprojeto de infraestrutura: a construção de uma ponte de aproximadamente 13 km entre Salvador e a Ilha de Itaparica. O projeto da Ponte Salvador-Itaparica é parte do Sistema Viário do Oeste que pretende gerar um novo vetor de desenvolvimento urbano e regional para o Estado da Bahia. Todavia, a realização deste macroprojeto não transcorre em um vácuo conceitual, ao contrário, está intrinsecamente atrelada às infraestruturas preexistentes no território. Este artigo propõe uma análise detalhada dessas principais infraestruturas, enfatizando sua relevância na viabilização da ponte em questão.
Diante do atual estado do projeto da Ponte Salvador Itaparica Para a travessia da Baía de Todos os Santos, que se construída ligará de modo rodoviário Salvador à Ilha de Itaparica, este estudo se propõe a identificar algumas das pontes que se destacam no perímetro territorial que envolve esta pesquisa. Entre elas, duas pontes ferroviárias do século XIX, duas pontes rodoviárias do século XX, uma ponte recém-inaugurada em São Roque do Paraguassu e a proposta de travessia Salvador-Itaparica, elaborada por Sérgio Bernardes em meados do século XX.
Inicialmente serão apresentadas as pontes férreas do século XIX; a Ponte Dom Pedro II, entre as cidades de Cachoeira e São Félix, sobre o Rio Paraguaçu, e a Ponte São João que liga os bairros de Plataforma ao Lobato, na capital, Salvador. Ambas são pontes centenárias, férreas e ainda se encontram em funcionamento. Posteriormente, as pontes rodoviárias do século XX; a Ponte do Funil, que liga à contracosta da Ilha de Itaparica ao continente, a Ponte da Pedra do Cavalo entre os municípios de Cachoeira e São Félix e a Ponte sobre o Rio Baetantã, em São Roque do Paraguassu. Por fim, será apresentada a ponte originalmente proposta pelo arquiteto Sérgio Bernardes, na década de 1960, como parte integrante do seu planejamento para o Centro Industrial de Aratu, (o CIA), RMS.
1.AS PONTES FÉRREAS
O período imperial brasileiro foi marcado por eventos históricos, à exemplo da abolição da escravatura em 1888 e finalizou-se com a Proclamação da República em 1889. Merece destaque durante o império a promulgação da Lei das Terras e o fim do tráfico de pessoas para escravização(1850), quando, segundo VASCONCELOS (2016), os recursos destinados a esta atividade foram revertidos e aplicados em setores urbanos, que reconfiguraram a infraestrutura baiana.
Mapa 01 -Mapa autoral do Sistema Ferroviário da Região estudada.
Assim como o período colonial foi beneficiado pelas tecnologias da navegação e pelos avanços nas ciências cartográficas, o período imperial teve seu apogeu no desenvolvimento das tecnologias do transporte a vapor, tanto na navegação quanto nas ferrovias.
A implantação de ferrovias na Bahia ocorreu com um relativo pioneirismo dentro do quadro nacional, na década de 1850. Era um momento da história do país em que os agentes econômicos estavam plenos de otimismo: os conflitos internacionais aparentemente resolvidos, as fronteiras asseguradas, o capital acumulado sendo colocado na circulação financeira devido ao processo de término da legalidade do tráfico de escravos, os cofres públicos com maiores arrecadações” (Zorzo, 2001, p 77).
A ocupação urbana da América do Sul a partir da chegada dos colonizadores europeus teve seu início a partir das áreas litorâneas; os primeiros aldeamentos e vilas aconteceram em áreas onde o acesso das embarcações era mais seguro. Assim ocorreu a ocupação urbana ao longo do litoral brasileiro, da Vila de São Vicente no litoral paulista à Baía de Todos os Santos, do Recife à Guanabara, de Florianópolis a Belém, todos os núcleos urbanos se formaram a partir desta primeira ocupação nacional, que até hoje representa uma significativa característica do país. As principais metrópoles brasileiras são cidades litorâneas, exceto as cidades que se desenvolveram posteriormente à integração territorial, por meio de sistemas de transportes que evoluíram com o passar do tempo.
Segundo ZORZO (2001), a Bahia do século XIX apresentava uma composição territorial com intensas desigualdades regionais, estas desigualdades tornavam-se mais nítidas à medida que se afastava do litoral. As cidades mais próximas do litoral tiveram seu desenvolvimento urbano ao longo dos séculos, porém, os territórios mais internos, adentrando o continente, mantinham características dos séculos anteriores, inclusive ocupados por aldeamentos indígenas.
Esta variegada realidade regional apresentava a incidência de vários tipos de assentamentos originados em épocas distintas, interconectadas por lentas redes de comunicação e organizados de acordo com uma malha político administrativa em constante rearticulação em face das sérias crises que se sucederam na história do Brasil (Zorzo, 2001, p. 18).
Em relação à capital baiana, VASCONCELOS (2016) afirma que o Estado continuou intervindo no funcionamento da cidade e destaca o estabelecimento da concessão da ferrovia da Bahia (Salvador) ao São Francisco, em 1853. É importante destacar que os investimentos em infraestrutura urbana demandam a implantação de equipamentos urbanos, a exemplo das ferrovias que demandam de estações ferroviárias; o mesmo autor destaca ainda que no nível provincial, o Estado tomou muitas iniciativas, sobretudo nas obras públicas e na implantação de equipamentos e serviços urbanos (Vasconcelos, 2016, p. 248).
No século XIX, a cidade do Salvador e as demais cidades que compunham a rede urbana do recôncavo contavam com uma boa infraestrutura de transportes e comunicações; é o caso das pontes supracitadas, dos portos e das estações ferroviárias.
1.1 PONTE DOM PEDRO II
A ponte Dom Pedro II, que conecta as cidades de Cachoeira e São Félix no Recôncavo da Bahia, é um elemento que, além de patrimônio histórico, agrega valor simbólico às cidades e foi inaugurada pelo próprio imperador Dom Pedro II, em 7 de julho do ano de 1885 – Estrada de Ferro Central da Bahia. Esta ponte foi considerada até bem pouco tempo a maior obra de arte realizada no Brasil (Santos, 2010). Sua estrutura, que foi originalmente construída em ferro e madeira, mede 365 metros dividida em quatro vãos, sendo que os dois vãos centrais medem 91,50 metros, com capacidade de carga para trens e pessoas. A obra da construção da ponte teve início em 1882 e suas peças foram produzidas em um estaleiro na Inglaterra, fazendo assim uma travessia no Oceano Atlântico até a sua montagem sobre as águas do Rio Paraguaçu.
Figura 1 - Ponte Dom Pedro II vista em sobrevoo.
Encravada no Vale do Paraguassu, a ponte Dom Pedro II historicamente representa um momento de grande efervescência da economia, seja da produção do açúcar, do tabaco ou por Cachoeira se constituir, àquela época, como principal entreposto comercial, agregando produtos que vinham do Sertão e produtos que vinham de Salvador.
Cachoeira era uma cidade tão importante que foi a primeira a merecer uma ponte sobre o seu rio, ponte está tanto mais útil quanto o Paraguaçu, a vimos, como muitos rios do Recôncavo, corre entre margens escarpadas e íngremes (Mattoso, 1992, p. 60).
A ponte foi projetada para facilitar a circulação de fluxos entre o litoral e o interior do continente. A cidade de Cachoeira ao longo de séculos exerceu a função de porto e entreposto comercial, bem como foi palco de relevantes batalhas durante o período da conquista da Independência da Bahia.
Hoje, pedestres, trens, bicicletas, animais e automóveis atravessam diariamente a ponte secular. Devido aos intervalos restritos à passagem dos trens e ao aumento da frota de veículos nos municípios de Cachoeira e São Félix, são identificáveis problemas de engarrafamento nos acessos à ponte nos horários de fluxo intenso. Há também o risco dos trens que transportam cargas químicas e inflamáveis; durante o dia, podem ocorrer até dez interrupções no tráfego intra urbano entre as cidades para a passagem, manobras e travessias dos trens.
Além de minérios, os comboios da Ferrovia Centro Atlântica (FCA), que adquiriu a concessão da malha ferroviária em 1997, cruzam o centro de Cachoeira e São Félix pelo menos cinco vezes ao dia, carregando produtos inflamáveis como gasolina e óleo diesel. O trecho é considerado um dos mais perigosos em todos os 7080 km da malha férrea explorada pela FCA. (Jornal A Tarde, julho/2006)
O Ministério dos Transportes, por meio do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) celebrou em 2001, junto à Prefeitura Municipal de São Félix,um convênio para a execução da obra do contorno ferroviário. Esta obra previa a construção de nove viadutos ferroviários e quatro rodoviários com o propósito de desafogar a ponte.
A implantação do contorno ferroviário de São Felix/BA, obra prevista no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal e objeto da presente fiscalização, intenta solucionar problemas existentes há várias décadas no referido município, e na vizinha Cachoeira, na região conhecida como Recôncavo Baiano, com a mudança do traçado atualmente existente da ferrovia Iaçu/BA Mapele/BA, EF 025 (PNV), linha sul, mais precisamente o segmento denominado de Gargalo do Paraguaçu, onde se encontra a centenária Ponte Dom Pedro II. (https://www.camara.leg.br/internet/comissao/index/mista/orca/orcamento/OR2015/Fiscobras2014/anexo/SINTETICOS/Sint%C3%A9tico_2014_125.pdf )
Figura 2- Fotografia histórica da Ponte Dom Pedro II no século XX.
1.2 PONTE SÃO JOÃO
A ponte São João é uma ponte ferroviária localizada na península de Itapagipe³ e é parte integrante da estrada de ferro Calçada-Paripe, conectando os bairros de Plataforma e Lobato, em Salvador. Sua estrutura foi inicialmente construída em 1860 com material importado da Inglaterra, basicamente uma estrutura metálica com extensão aproximada de 460 metros.
Figura 3 – Fotografia histórica da Estação de Trens da Calçada
³ A península de Itapagipe é a parte de terra de uma “Sub-baía” ou braço de mar da Baía de Todos os Santos.
A ferrovia que ligava a estação da Calçada ao bairro de Paripe foi a primeira ferrovia urbana de Salvador, sua malha consistia em uma única linha de bitola métrica com 13,5Km de extensão e dez estações. O intervalo médio entre a saída dos trens era de aproximadamente 40 minutos e a viagem completa durava cerca de meia hora; a tarifa cobrada era de R$0,50 e a meia entrada de R$0,25 para estudantes.
Figura 4 - Parte da Ponte São João com trem sobre os trilhos. Fonte: Google
A Estação de Trem da Calçada está localizada na Avenida Jequitaia, estrategicamente próxima ao Porto de Salvador, até a década de 1970 contava com um bonde que a integrava ao porto, visto que há aproximadamente 4 km de distâncias entre estes equipamentos.
Figura 5 -Fotografia aérea feita pelo google Earth, ilustra a extensão da ponte.
Em meados do século XX a ponte São João passou por uma reconstrução devido a problemas e desgastes na sua estrutura. Após reforma, foi reinaugurada em 1952. Durante os aproximadamente cinquenta anos que vão de meados do século XX até a primeira década do século XXI a Ponte São João funcionou como um importante meio de transporte/acesso à região da cidade de Salvador conhecida como Subúrbio Ferroviário.
Em 2003 o Governo Federal, junto à CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos) iniciou uma obra de recuperação desse sistema ferroviário. Já em 2010, uma quantia de 60 milhões de reais foi investida na reforma da Ponte São João, por meio de recursos do Governo Federal para requalificação de trens urbanos.
Os trens antes passavam pela ponte utilizando apenas uma linha a 20km/h; a reforma liberou duas linhas, com os trens circulando a 60 km/h.
Figura 6- Ponte São João. Salvador-Bahia. Fonte: Google.
O trem era utilizado diariamente como meio de transporte para a parcela da população que vive nos bairros do subúrbio ferroviário, por onde passava a linha do trem. Entretanto o uso de trem para passeio era pouco experimentado pelos soteropolitanos e turistas e poderia inclusive se tornar um “atrativo turístico” especialmente devido à exuberância da paisagem, à margem do mar da BTS.
A recente desativação do transporte ferroviário localizado na região do Subúrbio Ferroviário, na cidade de Salvador- Bahia, alterou a mobilidade urbana e as condições de vida de diversos usuários que utilizavam diariamente esse tipo de transporte público, seja pelo seu direito de ir e vir na cidade no que tange ao seu deslocamento seja para o trabalho, lazer, escola, universidade, etc. ou para usufruir de bens e serviços na cidade exercendo assim sua cidadania. (Bárbara Ysis Macêdo Sena, Observatório da Mobilidade de Salvador, 2023) https://www.obmobsalvador.org/post/os-impactos-da-retirada-do-trem-na-condi%C3%A7%C3%A3o-de-vida-e-mobilidade-dos-trabalhadores-do-sub%C3%BArbio )
2 PONTES RODOVIÁRIAS
O modo rodoviário de transporte começou a ser amplamente estimulado no Brasil a partir de meados do século XX. Na Bahia, a expansão da malha rodoviária aconteceu, principalmente, entre o final da década de 1960 e o início da década de 1970. As duas principais pontes apresentadas aqui referem-se a obras executadas pela Odebrecht; empresa baiana que à época (e durante muitos anos) esteve dominante no cenário da construção civil, estadual e nacional.
Assim como no caso brasileiro, no Recôncavo, o processo de desenvolvimento urbano calcado no modo rodoviário motivou a desarticulação das ferrovias que predominaram ao longo do século XIX até este período.
Mapa 2 -Mapa autoral macro área de estudo com destaque para sistema rodoviário em um cenário onde a ponte está prevista.
2.1 PONTE DO FUNIL
A Ponte do Funil, como é tradicionalmente conhecida a Ponte João das Botas, desempenha o papel de conectar a Ilha de Itaparica ao continente por meio rodoviário através da BA-001. Conecta Jiribatuba, no município de Vera Cruz ao continente, no município de Jaguaripe, próxima à foz do Rio Jaguaripe. Com extensão de 660 metros, a ponte conta apenas com duas vias em sentidos opostos (mão e contramão), sem acostamento. Concluída em 1968, no governo de Luiz Viana Filho pela construtora Odebrecht, à época uma das primeiras obras em concreto pré-moldado executadas no Estado da Bahia.
Figura 7- Ponte do Funil (João das Botas) vista da Ilha de Itaparica.
No cenário da construção da ponte Salvador Itaparica, a Ponte do Funil adquire um papel complementar, servindo como um segundo elo, visto que complementa a travessia da capital ao continente sentido oeste. O atual projeto do SVO prevê uma intervenção estrutural para requalificar a BA-001 na Ilha de Itaparica e adequar a infraestrutura viária local por meio da duplicação da Ponte do Funil (Vera Cruz-Jaguaripe) para que esta comporte a intensidade do fluxo de veículos estimado. Prevê ainda a construção de uma via alternativa para tráfego pesado na BA-046 e um novo trecho rodoviário entre Santo Antônio de Jesus e Castro Alves (BR-116).
Figura 8 – Ponte do funil, imagem disponível no twitter da Odebrecht.
2.2 PEDRA DO CAVALO
A ponte da Pedra do Cavalo foi construída concomitante à construção da Barragem Hidroelétrica da Pedra do Cavalo, nas décadas de 1970 e 1980. A barragem de Pedra do Cavalo, no Planalto do Recôncavo Baiano, mais especificamente na Bacia do Rio Paraguaçu, é um reflexo da política desenvolvimentista adotada no Brasil neste período.
A construção da barragem demorou alguns anos e consumiu muitos recursos públicos. O baixo Paraguaçu se tornou um canteiro de obras, atraindo milhares de pessoas para a região do recôncavo, sobretudo Cachoeira, São Felix e Muritiba, em busca de uma oportunidade de emprego em uma região que já sofria há muitas décadas com uma grande estagnação econômica. Foram necessárias várias intervenções de engenharia na região para que o empreendimento pudesse ser executado.
A ponte da Pedra do Cavalo possui um vão de 1500 metros de extensão por 30 metros de largura, a uma altura que varia entre aproximadamente 40m e 70 m do rio Paraguaçu.
Figura 9 – Ponte e Barragem da Pedra do Cavalo.
Pedra do Cavalo, Itaipu, Sobradinho, Ponte Rio-Niterói, são obras de grande porte e possuem características bem semelhantes entre si, pois conservam nas suas estruturas físicas o traço reto, a monotonia das edificações sem identidade (Palma, 2007). Quem poderia opor-se a um Estado capaz de construir grandes empreendimentos que impulsionam uma maior “diversificação” das atividades produtivas do país?
Esse tipo de obra monumental, que é uma característica dos macroprojetos de infraestrutura, faz com que as pessoas se sintam pequenas diante delas, além de promoverem visibilidade política a quem as realiza, seguindo padrões do urbanismo e arquitetura da modernidade. Nesse contexto foi construída Pedra do Cavalo, e sua inauguração em 1985, trouxe uma série de demandas para o Estado, entre elas a relocação de famílias ribeirinhas e posseiros que viviam às margens do rio Paraguaçu e Jacuípe. A barragem possui 142 m de altura, e é uma das mais altas do país.
A obra, que teve seu Edital de Concorrência Pública publicado em 30 de abril de 1978, foi iniciada em 1979 e concluída em 1985. A execução da obra ocorreu por meio de um consórcio entre a Odebrecht, Contic Portuária e Cepel. Esta ponte tem uma extensão de aproximadamente 500 metros e conta com duas vias em sentidos opostos e acostamento nos dois sentidos.
3 PONTE SOBRE O RIO BAETANTÃ
Localizada no município de Maragogipe, precisamente no distrito de São
Roque do Paraguaçu, a ponte sobre o Rio Baetantã foi inaugurada pelo Governador Rui Costa no dia 14 de julho de 2020. A obra, que tem 525 metros, facilitará os fluxos entre municípios da Região Metropolitana de Salvador e do Recôncavo, na BR-420. O investimento para a construção desta ponte foi de R$53 milhões e beneficiará diretamente 155 mil habitantes que vivem em Maragogipe, Nazaré, Salinas das Margaridas, Vera Cruz, Itaparica e as localidades de São Roque do Paraguaçu, Cairu e Enseada.
Figura 10: Ponte sobre o Rio Baetantã. Fonte: SEINFRA
O distrito de São Roque do Paraguaçu, cercado por comunidades quilombolas, foi contemplado com altos investimentos que resultaram na construção de um estaleiro no ano de 2010. A Petrobrás seria uma das empresas beneficiadas com este estaleiro, entretanto esta infraestrutura funcionou por pouco tempo e foi desativada.
Atualmente, devido ao seu potencial para atividades portuárias, têm funcionado como um porto-seco. Rui costa, na inauguração da ponte discursou:
“Esta é uma obra grande que se junta a outras diversas obras realizadas nesta região pelo Governo do Estado e que somam um investimento de mais de R$100 milhões. O objetivo é reforçar toda essa infraestrutura, no sentido da logística, para esta baía, que tem um potencial enorme de geração de emprego. Poucos lugares do mundo têm essa condição geográfica que possibilita que empresas venham se instalar para a construção de plataformas e de navios. É uma região que tem muito potencial e estamos investindo nisso”.
Além da ponte, Rui Costa entregou a obra da rodovia BR-420, referente ao trecho de 34 quilômetros que liga São Roque a Maragogipe. A obra contou com recursos da ordem de R$15 milhões. A construção desta ponte demonstra o interesse do governo baiano em investir em infraestrutura rodoviária neste território, sendo assim, fica clara a intenção de “preparar o terreno” para a expansão da metrópole no sentido Oeste da BTS.
3 A PONTE SALVADOR-ITAPARICA NO PLANO DE SÉRGIO BERNARDES PARA RMS
A localização estratégica do município de Salvador, quando comparado a outros municípios do nordeste, devido a sua centralidade entre o sudeste e o Nordeste – garantindo-lhe vantagens locacionais–, bem como a exploração petrolífera iniciada em meados do século XX com a RLAN4 favoreceu a implementação do Centro Industrial de Aratu. Havia também, como atrativos, terrenos de baixo custo, recursos naturais necessários e uma boa infraestrutura de ferrovias e portos.
A Rede Urbana é, ao mesmo tempo, reflexo e condição da divisão territorial do trabalho. Reflete na medida em que o espaço físico oferece vantagens locacionais para a expansão da produção capitalista, nos padrões de acumulação que vêm se dando ao longo dos anos. Desde sempre, utiliza uma lógica calcada na minimização de custos e maximização de lucros, tendo como alicerce o progresso técnico. Para melhorar os resultados da rede, é requisito básico a produção em escala, a ampliação de ocupação do espaço, da circulação, e a acessibilidade é definida a partir de modelos de transporte mais eficientes (SILVA, I., ZORZO, F. A. . Os portos e as pontes na Baía de Todos os Santos: pontos e contrapontos do planejamento urbano e regional, 2018).
O arquiteto Sérgio Bernardes, responsável pela elaboração do projeto do CIA, propôs uma ponte sobre as águas da BTS, inspirado pelo modelo “beltway”5. Seu plano era integrar o CIA ao interior do continente através da baía, de maneira a criar uma nova
5em inglês “belt” significa “cinto” e “way”, “caminho”; aproxima-se de um cinturão, ou anel rodoferroviário.
centralidade a partir deste anel rodoferroviário facilitando a chegada das matérias primas, bem como o escoamento da produção industrial do CIA.
A proposta de uma ponte para fazer face a essa travessia constitui, originalmente, uma indicação do plano do CIA, da década de 1970, como forma de viabilizar um anel rodoviário que ligasse Salvador à nova zona industrial definida para o Recôncavo. Pelos altos custos e inviabilidade técnica atestada então, a proposta não teve seguimento e, como alternativa, foi implementado o sistema de ferryboat”(Gordilho, 2014, p.183).
Figura 11: http://www.pontesalvadorilhadeitaparica.ba.gov.br/
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa se debruçou sobre as pontes mais importantes que estão inseridas no entorno da Baía de Todos os Santos e servem como parte da articulação do sistema de transportes preexistente na região. Entende-se que essas pontes são partes da infraestrutura produtiva da Região Metropolitana de Salvador e do Recôncavo e por esta razão não houve um aprofundamento nas infraestruturas urbanas internas da Metrópole.
Ao considerar a possibilidade de execução do projeto de construção da “Ponte Salvador-Itaparica” é possível notar um discurso desenvolvimentista que enxerga o macroprojeto do Sistema Viário do Oeste como um vetor de expansão da malha urbana, e atribuem à ponte o slogan de “a ponte para o desenvolvimento”. Entretanto, de acordo com Manuel Herce, cada vez que se constrói uma nova estrada na periferia, se produz, em seu entorno, uma mudança de valor da terra.
As capitais sul-americanas são também exemplos contundentes desse fenômeno, junto ao abandono das áreas centrais, em um exercício contínuo de expansão das cidades às zonas valorizadas pela construção de autoestradas, para, mais tarde, recuperarem o interesse pelos seus centros, apesar dessa expansão periférica (Herce, 2022, p. 31).
Deve-se problematizar, portanto, tanto a real necessidade de construção da ponte, quanto a escolha exclusiva pelo modo rodoviário de transportes, especialmente ao lembrar que em sua concepção inicial, Sergio Bernardes propunha uma ponte rodoferroviária. Ainda conforme HERCE (2022), o desafio da mobilidade urbana para todos está em ter atenção às diferentes exigências e demandas de todos os motivos e modos de deslocamento, priorizando os deslocamentos não motorizados.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, A. B. O outro lado da baía: a gênese de uma rede urbana colônia. Edufba, Salvador, 2013.
MATTOSO, K. M. de Q. Bahia no século XIX: uma província no império. Nova Fronteira, 1992.
PALMA, E. G. A. Aplicação da Legislação Ambiental no Território da APA do Lago Pedra do Cavalo: o caso do núcleo de reassentamento Ilha de São Gonçalo.Orientador: Torres, Antonio Puentes. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós Graduação em Geografia, Salvador 2007
PINTO, I. M., DELGADO, J.P.M., MIRANDA, S.C.F ...Centralidades e Estrutura Espacial da Cidade de Salvador- Bahia.
SILVA, I. A. ZORZO, F. A. Os portos e as pontes na Baía de Todos os Santos: pontos e contrapontos do planejamento urbano e regional. Revista Chão Urbano. Rio de Janeiro, 2018.
VASCONCELOS, P. A. Salvador: Transformações e permanências (1549-1999). EDUFBA, Salvador. 2ª Ed.: 2016.
ZORZO, F. A. Ferrovia e Rede Urbana na Bahia: Doze cidades conectadas pela ferrovia no Sul do Recôncavo e Sudoeste Baiano (1870-1930). UEFS-BA, Feira de Santana. 1ª Ed.: 2001.
RODRIGUES, W. A. RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÃO - SINTÉTICO. Disponivel em: <https://www.camara.leg.br/internet/comissao/index/mista/orca/orcamento/OR2015/Fiscobras2014/anexo/SINTETICOS/Sint%C3%A9tico_2014_125.pdf >Acesso em: 24 de fev. de 2014.
SENA, B. Y. M.Os impactos da retirada do trem na condição de vida e mobilidade dos trabalhadores do Subúrbio* . Disponível em:
<https://www.obmobsalvador.org/post/os-impactos-da-retirada-do-trem-na-condi%C3%A7%C3%A3o-de-vida-e-mobilidade-dos-trabalhadores-do-sub%C3%BArbio> Acesso em: 9 de nov. de 2022.