27/06/2019
CHÃO URBANO ANO XIX, nº 3 MAIO / JUNHO DE 2019
Editor
Mauro Kleiman
Publicação On-line
Bimestral
Comitê Editorial
Mauro Kleiman (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)
Márcia Oliveira Kauffmann Leivas (Cra. Em Planejamento Urbano e Regional)
Maria Alice Chaves Nunes Costa (Dra. Em Planejamento Urbano e Regional) – UFF
Viviani de Moraes Freitas Ribeiro (Dra. Planejamento Urbano e Regional IPPUR/UFRJ Luciene Pimentel da Silva (Profa. Dra. – UERJ)
Hermes Magalhães Tavares (Prof. Dr. IPPUR UFRJ) Hugo Pinto (Dr. Em Governação, Conhecimento e Inovação, Universidade de Coimbra – Portugal)
Editores Assistentes Júnior
Beatriz Angelo e Julia Paresque
IPPUR / UFRJ
Apoio CNPq
LABORATÓRIO REDES URBANAS LABORATÓRIO DAS REGIÕES METROPOLITANAS
Coordenador
Mauro Kleiman
Equipe
Beatriz Mesquita Angelo e Julia Paresque
Pesquisadores associados
André Luiz Bezerra da Silva, Audrey Seon, Humberto Ferreira da Silva, Márcia Oliveira Kauffmann Leivas, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviane de Moraes Freitas Ribeiro, Vinícius Fernandes da Silva, Pricila Loretti Tavares
ÍNDICE:
NOTAS PRELIMINARES SOBRE AS ÁREAS MAIS PRECÁRIAS NOS COMPLEXOS DO ALEMÃO E PENHA NO RIO DE JANEIRO
Julia de Souza Paresque¹
¹ Graduanda em Ciências Sociais- IFCS-UFRJ
1-ÁREAS MAIS PRECÁRIAS EM FAVELAS
Áreas mais precárias do que em geral já se encontra nas favelas do Rio de Janeiro precisam ser desveladas e terem uma análise do seu quadro de tipologia de moradias, a questão de suas (im)possibilidades de acesso a água e esgoto e estrutura urbanística do lugar. Estas partes mais precárias, ou sub-áreas, no interior de favelas, ainda são muito pouco reconhecidas, e seus problemas enfrentados pelo poder público e suas políticas urbanizadoras como idênticos a todas as demais áreas das favelas, especialmente no que diz respeito a serviços urbanos de água e esgoto, o que tem conduzido a uma persistência da ausência e/ou precariedade, ou um processo deficiente na implantação e resultados para uma efetiva articulação a serviços de água e esgoto. Essas partes são aquelas que não tiveram obras de água e esgoto; ou foram alvo de intervenções parciais, pontuais. Mesmo que tenham tido, ou estejam sendo objeto de obras de implantação de redes de água e esgoto mais generalizadas, ao não terem sido reconhecidas suas particularidades sociais, culturais e econômicas são importantes objetos de análise, dado a manutenção da ausência e/ou forte precariedade de atendimento oficial de abastecimento de água e coleta de esgoto, ou parcial atendimento face a seus graves problemas de carência. São áreas, que por dados secundários, e observação direta de campo, se pode ter como hipótese inicial, por comparação com as outras favelas de cada Complexo que estudamos, onde se pode visualizar sua diferenciação como apresentando posição inferior, em termos de infraestrutura básica; em aspectos sociais e econômicos, e nitidamente com tipologia de moradia e configuração do lugar diferenciados e mais precárias e problemáticas face às demais partes dos Complexos de Favelas. Além disto, são áreas com muito menos pontos e diversificação de comércio; em geral de risco ambiental; e apresentam flagrante risco de insegurança dado a presença ostensiva do domínio do tráfico de drogas; e assim contam com atração ainda muito reduzida para produção imobiliária informal rentista, encontrada em outras partes dos Complexos. Como consequência, se impõe maior análise, para o seu desvelamento, identificação de diferenciação socioespacial, com foco na infraestrutura de água e esgoto, como lugares à margem no interior de favelas, o que induziria a determinado padrão inferior de suas moradias, e uma tipologia própria de arranjos de seus espaços internos e nas rotinas de seus habitantes, não mais comuns as favelas atuais, e sim se reportando àquelas existentes até o final dos anos 1970, tornando seu registro e análise ainda mais necessário e importante.
Terra Prometida (Complexo da Penha) Favelinha da Skol (Complexo do Alemão)
1- Favelinha da Skol no Alemão e Terra Prometida na Penha.
Pesquisando os vastos Complexos do Alemão e da Penha identificamos como exemplares de áreas mais precárias os casos da Favelinha da Skol (no Alemão), e Terra Prometida (na Penha) que passamos a examinar mais detidamente. A metodologia do estudo teve como característica ser de corte qualitativo, combinando visitas exploratórias, entrevistas com os moradores, observação do interior das moradias, trabalhando suas percepções sobre as mudanças em suas moradias, nos arranjos internos e nas rotinas do cotidiano diante da questão do acesso a redes de água e esgoto, contrastando a percepção dos moradores com observação técnica direta de campo, e tomada de imagens fotográficas. Tomamos como fundamento teórico básico a infraestrutura não como objeto meramente técnico, tratado como algo estanque aos demais elementos do território, mas sua dimensão social como objeto sócio-técnico (Amar 1987; Dupuy,1984,1985).
Como elementos parciais já apurados podemos apontar que esses lugares no interior dos Complexos se encontram com carência muito importante e/ou forte precariedade de acesso a água e esgoto, sendo lugares da pobreza, com parte com aspecto de ruralidade, estando longe de uma mínima urbanização.
O cenário encontrado na localidade chamada “Terra Prometida” no Complexo da Penha, é calor extremo, chão de terra, presença de animais como cavalo e galinhas, árvores, casas improvisadas com resto de madeiras, lona, madeirite. Há casas abandonas e pouca ou nenhuma iluminação. O perfil sociodemográfico da população é grande parte formado por pessoas que migraram do Nordeste para o Rio, ou que já nasceram na localidade do Complexo da Penha. População formada majoritariamente por mulheres, mães solteiras com aproximadamente de 2 a 5 filhos.
Terra Prometida – Complexo da Penha
Terra Prometida – Complexo da Penha
Já na localidade Favelinha da Skol no Complexo do Alemão, encontra-se esgoto a céu aberto, fezes de animais, lixo e destroços de casas que anteriormente foram derrubadas no todo ou em parte atingidas por chuvas. Há um esgoto a céu aberto que ronda toda a comunidade, ficando bem próximo ao muro das casas. Na Favelinha da Skol, as casas que ainda se encontram de pé são adaptadas para não serem atingidas pelas chuvas. São localizadas em áreas mais altas de forma a tentar impedir alagamentos. Em sua grande maioria são casas feitas de tijolos, sem qualquer pintura, os cômodos são improvisados, muitas vezes apenas um único cômodo possui inúmeras funções. Cozinha torna-se também área de lavar roupas, quarto torna-se área de secar roupas, casas tornan-se comércios locais dedicados a vende-se bala, biscoito, picolé, como forma de fonte de renda para família. Já na Terra Prometida, o cenário são casas feitas de lonas, restos de madeira de armários, telhas e ferro. A maioria tem 1 a 2 cômodos. São extremamente quentes e não possuem local privado além de um pequeno banheiro. Nada separa a sala, de cozinha ou de quartos. Tudo parece um cômodo só.
Segundo dados do censo do IBGE de 2010 a população do Complexo do Alemão era de 69.143 habitantes. Atualmente, estima-se que a população tenha ultrapassado os 75 mil habitantes. Na favelinha da Skol em 2018 existiam 250 famílias, cujo a maioria vivia na localidade a mais de 25 anos. Depois das chuvas de fevereiro, (que destruíram a comunidade) apenas 25 famílias permaneceram no local, não comprimindo a ordem de remoção ordenada pela prefeitura.
Favela da Skol – Complexo do Alemão
Favela da Skol – Complexo do Alemão
Quando nos deparamos com estes dois casos de estudo anotamos que neles persiste o que denominamos de uma “não-política” do Estado brasileiro face tanto a questão da moradia do pobre como da articulação da mesma a um mínimo de infraestrutura básica, excluindo estes lugares pobres da articulação com os serviços de água e esgoto. Assim, a favela enquanto lugar da ausência e/ou precariedade de acesso a serviços básicos à vida se mantém, nesses dois casos como o espaço da improvisação e da invenção e informalidade na produção da sua estrutura urbanística e da moradia, e da busca do provimento de água e descarte de esgoto.
Ao se pensar as características dos dois casos volta a se revelar, igualmente, a perda das fronteiras entre espaço público e privado, na medida que não existe nela nem uma privatização estrito senso do território, nem a presença do Estado que pudesse lhes inscrever na esfera pública. A ausência e/ou precariedade de acesso-articulação a redes oficiais de infraestrutura como as de água e esgoto, entre outras, obriga os moradores a buscarem, de forma cotidiana e várias vezes ao dia um percurso, uma passagem permanente, ainda que intermitente entre o espaço privado da moradia e o público para se prover de serviços urbanos. Estão, assim, nas proximidades da urbanização, mas não se colocam inseridas no mundo urbano, dado as características de moradias improvisadas e ausência e/ou forte precariedade da possibilidade de acesso a água e esgoto, condições mínimas de inserção na cidadania.
Referências Bibliográficas
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