09/07/2015
ANO XV – N° 3 MAIO/JUNHO 2015
Editor
Mauro Kleiman
Publicação On-line
Bimestral
Comitê Editorial
• Mauro Kleiman (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)
• Márcia Oliveira Kauffmann Leivas (Dra. em Planejamento Urbano e Regional)
• Maria Alice Chaves Nunes Costa (Dra. em Planejamento Urbano e Regional) - UFF
• Viviani de Moraes Freitas Ribeiro (Dra. Planejamento Urbano e Regional IPPUR/UFRJ)
• Luciene Pimentel da Silva (Profa. Dra. – UERJ)
• Hermes Magalhães Tavares (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)
• Hugo Pinto (Dr. em Governação, Conhecimento e Inovação, Universidade de Coimbra – Portugal)
IPPUR / UFRJ
Apoio CNPq
LABORATÓRIO REDES URBANAS
LABORATÓRIO DAS REGIÕES METROPOLITANAS
Coordenador Mauro Kleiman
Equipe
Carla Caroline Damasceno Lopes, Flávia Garofalo, Gizele da Silva Ribeiro, Larissa Ling Gonçalves Setianto.
Pesquisadores associados
André Luiz Bezerra da Silva, Audrey Seon, Humberto Ferreira da Silva, Márcia Oliveira Kauffmann Leivas, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviani de Moraes Freitas Ribeiro, Vinícius Fernandes da Silva, Pricila Loretti Tavares.
ÍNDICE
O papel da sociedade civil no desenvolvimento regional brasileiro: bloqueios e expectativas
Fernanda Moscarelli ...........................................................................................p.3
Avaliação do fluxo de veículos, densidade calorimétrica e ocorrência de doenças cardiovasculares e respiratórias em Barreiras – BA
Pollyana Ferreira da Silva, Andréia Porto de Souza, Prudente Pereira de Almeida Neto e Roberto Bagattini Portella.....................................................................p. 25
O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NO DESENVOLVIMENTO REGIONAL BRASILEIRO: BLOQUEIOS E EXPECTATIVAS
Fernanda Moscarelli*
* Pós-Doutoranda Júnior no Instituto de Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro; pesquisadora financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). Professora das Faculdades Meridionais (IMED), Passo Fundo-RS; fe_moscarelli@yahoo.com.br
RESUMO
Desde meados dos anos 90, algumas experiências de planejamento e gestão cooperativa regionalizada apareceram e se destacaram na sua capacidade de inovação e na sua forma associar a sociedade civil à ação governamental. Apesar de apresentarem excelentes elementos de análise e de terem conquistado um espaço importante na agenda política local, estas políticas não foram capazes de ultrapassar as diferenças de desenvolvimento intra-regional, historicamente construído. Este trabalho tem por hipótese que os poucos resultados observados a partir destas experiências decorrem tanto de uma inadequação do sistema federativo brasileiro à aplicação destas políticas quanto da falta de capacidade financeira dos entes federados para apoiar projetos de desenvolvimento regional de forma mais intensa e perene. As estruturas instituídas para realizar a interface destas políticas de caráter regional com as escalas político-administrativas são ainda recentes e sua ação é incipiente. Partindo da análise de duas experiências de cooperação para o desenvolvimento territorial, este trabalho procura realizar um balanço das necessárias adaptações que nosso sistema de organização político-administrativa e gestão pública deverão realizar para facilitar a aplicação dos princípios constitucionais de cooperação e desenvolvimento equilibrado.
INTRODUÇÃO
O equilíbrio regional é a aspiração de muitas administrações territoriais tanto no Brasil como no mundo. Se um equilíbrio territorial perfeito tem ares de utopia, a busca por uma redução das disparidades intra-regionais, intra-nacionais e mesmo no interior de conglomerados como o europeu, é possível através das políticas que visam desconcentrar a geração da renda (tecnologia, indústria, serviços terciários especializados, etc..) e o desenvolvimento social sem prejuízo às regiões já desenvolvidas ou ao todo.
A experiência francesa, por exemplo, da criação das metrópoles de equilíbrio, proposta em 1964, foi pensada neste sentido. São contempladas as cidades ou grupos de cidades: Lille-Roubaix-Tourcoing, Nancy-Metz, Strasbourg, Lyon-Grenoble-Saint-Etienne, Marseille, Toulouse, Bordeaux, Nantes-Saint-Nazaire[1]. Esta política foi uma reação à publicação de Gravier, “Paris e o deserto francês”[2], e o reconhecimento de uma super-concentração de recursos na capital Paris, sede política, capital econômica e turística.
O sucesso[3] da política de equilíbrio administrativo e demográfico francesa reside no fato que ela não foi realizada isoladamente de outras políticas. Ela veio a completar uma série de medidas integrantes de uma política nacional, promovidas pela DATAR[4], como a criação das tecnopôles industriais e terciárias, o desenvolvimento de ligações rodoferroviárias importantes e mesmo o apoio a proliferação de aeroportos “provinciais”. Para realizar esta política nacional de desconcentração, foram necessários investimentos regionalizados diferenciados, aplicados por cada setor integrante.
No Brasil, as políticas ditas regionalizadas sofrem pelo fato de não estarem inseridas num contexto macro – dito nacional - de desenvolvimento regional. Apesar de algumas políticas claramente regionais, aplicadas pelo estado brasileiro em torno da Amazônia, região Nordeste e posteriormente centro-oeste; no resto do país, as diferenças intra-regionais se acentuaram, polarizando todas as atividades e riquezas em alguns centros urbanos[5], relegando ao restante a permanência da situação de “deserto” ou a decadência das atividades existentes.
Além disso, o período desenvolvimentista brasileiro, que concentrou a industrialização na região sudeste, acentuou esta disparidade, atraindo um saldo migratório excepcional às capitais estaduais. Cabe lembrar que o aumento da população urbana brasileira no período foi também excepcional[6], estes dois fatores causaram um desequilíbrio entre o numero de novos residentes e a capacidade urbana (residencial, equipamentos e infraestruturas) de acolhimento destes. Não é por acaso que os anos 30-60 marcaram o apogeu da informalidade urbana que é hoje herança indiscutível nas cidades brasileiras.
Até inicio dos anos 2000 havia uma ausência de regulação do único texto que tratava da reforma urbana e que trazia elementos capazes de retomar a lógica do planejamento metropolitano, o estatuto da cidade, assim como um vazio legislativo referente às cooperações intermunicipais para gestão metropolitana[7]. Esta falta de marco regulatório se agrava em função das disparidades intra-regionais de caráter metropolitano. Sabe-se que as 27 regiões metropolitanas concentram hoje 70 milhões de habitantes, sendo que 11 delas concentram 80% domicílios em forma irregular (CLEMENTINO, 2008). Ao mesmo tempo, as grandes metrópoles concentram as classes de maior renda brasileiras assim como a sede de grandes empresas nacionais e internacionais. Trata-se assim de desigualdades intrametropolitanas, que em face da dimensão das metrópoles atuais[8], adquire um caráter de desigualdades regionais.
Soma-se a isso o fato que os fluxos de pessoas e mercadorias no interior das zonas metropolitanas e a grande dimensão da mancha urbana ocupada por elas exigem uma forma de planejamento e gestão integrada. Tais aglomerados urbanos não podem ser geridos sem uma estrutura de planejamento e gestão regionalizada, de forma a priorizar antes o desenvolvimento do conjunto sobre as zonas já privilegiadas pelo seu poder de atração.
Assim, tanto no tocante às zonas metropolitanas quanto aos problemas regionais, persiste uma estrutura político-institucional que carece de textos legais que determinem o papel de cada ente federado e as formas de organização da cooperação federativa. Um vazio que só foi rompido, em alguns casos, pela iniciativa dos atores sociais, políticos e econômicos locais, que viam nas disparidades regionais forte bloqueio ao desenvolvimento endógeno de sua sub-região.
Neste contexto, a metade sul do estado do Rio Grande do Sul conseguiu atrair interesse estadual e nacional à problemática regional à ocasião do movimento pró-emancipação. Como reação ao movimento separatista, houve um reconhecimento das disparidades entre a região nordeste do estado (especialmente regiões metropolitanas de Porto Alegre e Caxias do Sul) face não somente à região sul do estado[9], mas também toda a faixa de fronteira oeste e norte. Os executivos estaduais democráticos (pós-1988) agiram nesse sentido, tentando criar bases institucionais para a aplicação de políticas regionalizadas, ora encabeçadas pelo gabinete do governador, ora delegando à sociedade civil à organização e gestão. Porém, como pretendemos demonstrar neste artigo, esta conscientização que implicou numa série de ações de cunho regionalizado obteve pouco êxito no combate às disparidades, pois estas ações estavam desarticuladas de uma política maior – a nível nacional – de tratamento das disparidades regionais e, portanto, sofreram a oposição dos setores - organizados isoladamente – e que não compactuavam com a prática de regionalização diferenciada dos investimentos. Situação agravada pela baixa capacidade de investimentos dos estados federados no inicio do período democrático. Esta hipótese de nosso trabalho converge às compreensões de Diniz (2001, p. 17), pois:
“Dadas as grandes desigualdades regionais e sociais e o atual estágio do desenvolvimento brasileiro, não é possível pensar em um projeto de desenvolvimento tecnológico e industrial sem a forte presença do Governo Federal”.
Quanto à questão metropolitana, percebe-se também que a reação dos atores locais também foi primordial no desenvolvimento de mecanismos cooperativos, chegando a incitar a institucionalização legal de textos organizadores das cooperações intermunicipais. Neste contexto o caso da auto-organização denominada “Grande ABC” se desenvolve de forma impressionante chegando a reorganizar o desenvolvimento local sob a forma de uma estratégia de desenvolvimento regional. A opção cooperativa, assumida pelas lideranças locais, permitiu à organização econômico-social regional fazer face às dificuldades resultantes da guerra fiscal[10] e a consequente delocalização das grandes empresas para outros estados. Porém, como tentaremos demonstrar, os esforços neste sentido encontram-se minimizados na sua aplicação em consequência tanto (a) da estrutura setorial altamente rígida que compõem o sistema federativo brasileiro, como (b) do principio da cooperação entre entes federados não completamente regulados pelo texto constitucional de 1988.
A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL: DAS SUPERITENDÊNCIAS REGIONAIS À AÇÃO DO MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO E DO MINISTÉRIO DAS CIDADES
A compreensão das disparidades regionais, ainda que historicamente presente nos discursos e ações pontuais de vários governos[11], só foi levada a cabo de forma mais importante nos governos Vargas e Juscelino Kubitschek, com a criação das primeiras instituições de combate à desigualdade regional – as superintendências regionais - visando o desenvolvimento das zonas pouco ocupadas demograficamente: região amazônica e centro-oeste.
Inicialmente, no período Vargas, estabeleceu-se as bases da ocupação das terras amazônicas. Ainda que existisse uma real preocupação com o desenvolvimento social e a integração econômica da região ao restante do país, sobrepunha-se a ideia de soberania e proteção da fronteira brasileira. Não é por acaso que de todas as ações visando o desenvolvimento regional, elaboradas pelos governos anteriores ao golpe, esta tenha sido aquela que foi mais incorporada pelo governo militar.
No final do governo Juscelino Kubitschek, os discursos pró-desenvolvimento regional são incorporados ao plano de governo, sendo dado especial destaque ao desenvolvimento da região nordeste através do que seria, por décadas, a maior instituição para o desenvolvimento regional brasileira, a SUDENE[12]. Estabelecem-se, assim, as primeiras políticas com foco no desenvolvimento da região nordeste e com ações de ocupação do oeste brasileiro, culminando com a inauguração da nova capital Brasília.
A consciência da crescente disparidade econômico-social entre as regiões sul e sudeste, de um lado, face à região nordeste, centro-oeste e norte, não foi abandonada no período militar (1964-1985-6), e estas instituições acabam absorvidas pelo novo “programa” de governo, através dos Planos Regionais de Desenvolvimento (Prodoeste, Poloamazônia, Polonoroeste, Polocentro, PRODECER, Região Geoeconômica de Brasília, PRODEOAN, PRODEGRAN)[13]. Infelizmente, todo este aparato burocrático-institucional teve seus objetivos desviados ao longo do período ditatorial e sua estrutura completamente esvaziada nos governos Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso. A retomada da discussão acerca do desenvolvimento regional ocorre a partir da segunda metade dos anos 90, ainda que de forma pontual e sem um plano nacional próprio, com o restabelecimento destas superintendências.
Cabe lembrar que até o inicio do governo Lula em 2003, as políticas de cunho metropolitano ficaram a cargo dos estados, sem uma articulação com outras escalas territoriais e de difícil costura com a estrutura dos ministérios, suas secretarias e fundos setorializados. Neste contexto, a corrente Neoliberal, aplicada pelos governos Collor de Melo e FHC nos anos 90 e inicio de 2000, não ajudou no equilibrio intra-regional e metropolitano. A ausência total do Estado no tocante ao direcionamento dos investimentos realizados pelo capital privado resultou numa hiperconcentração da riqueza nas regiões já dinâmicas e, portanto, mais atraentes para o investimento.
Assim, a partir da virada política de 2003 uma nova estratégia de desenvolvimento regional aparece sob uma estrutura institucional capitaneada pelo Ministério da Integração Nacional, então restituído. O Ministério será encarregado de trazer a cabo os grandes projetos de infraestrutura para o desenvolvimento nacional e as políticas e fundos de incentivo ao desenvolvimento visando o equilíbrio regional.
Referente à escala macrorregional, as políticas ditas regionalizadas ancoradas na ação do Ministério da Integração são organizadas em grandes linhas: Redes de Desenvolvimento Regional e Planos Regionais, tais como os Planos Macrorregionais de Desenvolvimento (Amazônia Sustentável, Nordeste/Semi-árido e Centro-Oeste) (BRASIL_a; CARGNIN e RÜCKERT, 2013). Na escala sub-regional, foi criado o PROMESO (Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável de Mesorregiões Diferenciadas), que atua no desenvolvimento de 13 mesorregiões[14]. Na escala mais urbana, foram também estruturados programas de desenvolvimento visando o equilíbrio intra-metropolitano, mas estes estão ligados ao ministério das cidades.
O Ministério das cidades foi criado numa perspectiva de Planejamento Urbano integrado, sendo assim estruturado como um ministério intersetorial. Ele é o responsável da política de desenvolvimento urbano e das políticas setoriais de habitação, saneamento ambiental, transporte urbano e trânsito; assegurando maior inter-relação entre elas. Quanto ao desenvolvimento da política urbana, estas têm por objetivo, assim como as políticas regionais do MI, “combater as desigualdades sociais” (BRASIL_c).
Desta forma Ministério da integração e Ministério das cidades estruturam-se como estruturas ministeriais de integração setorial em prol do desenvolvimento territorial, seja este desenvolvimento essencialmente urbano (de competência do M. Cidades), seja ele formado pela sinergia entre urbano-rural-périurbano (MI). Juntos, estes dois ministérios assemelham-se às delegações interministeriais francesas (DATAR) quanto à sua capacidade a ultrapassar a rígida organização político-administrativa dos Estados nacionais; mas diferenciam-se pela relação entre governo central e demais perímetros político-administrativos, mais descentralizada e mais próxima dos atores locais na experiência brasileira[15].
Considerando-se ainda que as grandes áreas urbanas não constituam mais uma zona densa e unipolar, mas que elas representam cada vez mais espaços de dimensões regionais “com características metropolitanas que, internamente, também apresenta uma hierarquização, já que é um aglomerado com concentração de poder econômico, social, cultural que não é semelhante para todos os espaços, no caso, municípios nele inseridos” (RIBEIRO et al, 2011, p. 179); tem-se um diagnostico similar quanto às desigualdades e, portanto, aparecem também semelhanças quanto ao tratamento destas questões.
Demonstraremos estas semelhanças através de duas experiências brasileiras[16], que merecem destaque graças à sua capacidade de auto-organização e constituem assim dois estudos de caso interessantes pra a questão do planejamento e gestão regional visando o desenvolvimento regional.
A EXPERIÊNCIA DOS COREDES DO RIO GRANDE DO SUL NA ARTICULAÇÃO DO PLANEJAMENTO REGIONAL
Como mostra o breve histórico de atuação governamental sobre as desigualdades regionais, as primeiras políticas regionais brasileiras primaram pela escala macrorregional (nordeste, Amazônia, etc...), sem distinguir importantes diferenças quanto ao desenvolvimento das sub-regiões internas a estes perímetros. Além do mais, alguns perímetros de subdesenvolvimento ultrapassavam as escalas administrativas estaduais, dificultando tanto em termos políticos quanto orçamentários as ações visando o desenvolvimento regional. Esta situação se alterou muito com a criação do MI e a adoção do PNDR I (2003-2012), que reconheceu as diferenças sub-regionais e a necessidade de articulação entre entes federados alcançados pelos mesmos problemas socioeconômicos.
Mas o reconhecimento desta nova escala sub-regional de tratamento das questões de desenvolvimento só foi possível pela ação pontual de experiências concretas, como a da criação dos Conselhos de Desenvolvimento Regional do Rio Grande do Sul (Coredes). Fundado a partir de uma mobilização da sociedade civil gaúcha e capitaneado pelas universidades comunitárias, os Coredes representam ao mesmo tempo um canal de inclusão da sociedade civil no Planejamento e Gestão regional e uma nova escala territorial de ação (BANDEIRA, 2011).
Cabe destacar, que diferente da criação de conselhos regionais na maior parte do mundo[17], os Conselhos de Desenvolvimento gaúchos tiveram sua gênese nas discussões acadêmicas universitárias e na pressão social dos cidadãos. Em nenhum momento sua criação foi determinada por alguma instância governamental, mas criado e auto-organizado pela sociedade civil, ele foi absorvido como estrutura de governança independente pelo governo estadual, que o regulou e criou um espaço de interface através dos Fóruns dos Coredes (ALLENBRANDT, 2010; CARGNIN, 2014).
Além do mais, segundo Dallabrida (2012, p. 3):
“(...) trata-se da única experiência de descentralização político-administrativa intra-estadual, pós Constituição de 1988, que não sofreu nenhuma interrupção desde sua criação, tendo passado por seis administrações estaduais, de partidos políticos diferentes”.
Atualmente existem no Rio Grande do Sul 28 Conselhos de desenvolvimento, com as mais diferentes tipologias e número de municípios integrantes. O Coredes Sul, por exemplo, é composto por 22 municípios e possui a segunda maior superfície dentre os Coredes. Um dos Coredes menores em superfície, o Coredes Vale do Caí, possui 19 municípios. Em 2003 foram criados os Conselhos Municipais de desenvolvimento – Comudes – que articulam o nível municipal com o regional.
A independência e auto-organização destes conselhos trazem como pontos positivos não somente o empowerment da sociedade civil, já que é ela que auto-estruturou os conselhos, mas também a flexibilização, uma vez que os conselhos auto definiram seus perímetros de ação segundo o que a própria sociedade entendeu como espaço homogêneo quanto às características socioeconômicas e quanto às dificuldades de desenvolvimento. Desta forma existem mais consensos que conflitos nas prioridades definidas no interior de cada Coredes.
Porém, apesar de apoiar esta estrutura, os executivos estaduais, ao longo várias mudanças de orientação política, pouco aproveitaram estas instâncias na sua estrutura de governo (BANDEIRA, 2011). O perímetro dos Coredes nunca foi utilizado como referência territorial pelo governo estado do Rio Grande do Sul. Adotar este perímetro como base para a descentralização da estrutura administrativa regionalizada do estado exigiria uma reestruturação administrativa que nenhum governador arriscou realizar (BANDEIRA, 2011; CARGNIN e RÜCKERT, 2013).
Ressaltamos que as chefias regionais e locais já existentes estão baseadas numa lógica de regionalização administrativo-setoriais, que parecem antes simples desconcentrações das instituições de Estados tipo unitários, que uma descentralização segundo os princípios federalistas tais como cooperação e articulação entre entes federativos não hierárquicos. Assim, os Coredes precisam se articular com estas estruturas, que não correspondem a seu perímetro de governança, e que possuem uma visão fragmentada e setorial dos problemas.
Para dificultar ainda a incorporação das prioridades dos Coredes nas políticas públicas estaduais, cada uma dessas administrações se organiza de forma diferente administrativamente. Desta forma, nem mesmo o executivo estadual possui uma visão completa das dificuldades técnicas, orçamentárias e de pessoal, pois o somatório das visões setoriais não permite o entendimento do todo (BANDEIRA, 2011).
Neste sentido, a criação do Fórum dos Coredes serviu mais como uma ponte entre os conselhos e o executivo estadual, que em espaço de discussão dos conselhos entre eles. Ele representa, no estado atual, o espaço privilegiado onde a sociedade civil gaúcha apresenta, de forma regionalizada, suas carências e procura, através de uma articulação política, uma resposta que alavanque o desenvolvimento da sua microrregião.
Assim, ainda que ao longo dos últimos quase 25 anos os Conselhos se consolidaram como instrumentos de incorporação da sociedade gaucha ao planejamento regional das políticas públicas (GARGNIN, 2014), constituindo canais favoráveis para novas formas de gestão cooperativa no âmbito do pacto federativo[18], sua atuação é ainda pouco impactante, pois investimentos em desenvolvimento regional que eles conseguem captar são insuficientes para criar uma dinâmica (GARGNIN, 2014).
Além da difícil articulação institucional, enumerada posteriormente, a necessidade de sobreviver como estrutura de conexão entre sociedade civil e governo exigiu alterações nas prioridades dos atores integrantes dos Coredes, que têm priorizado sua função de captadores de recursos do governo do estado[19] em detrimento da sua atuação privilegiada nas discussões e planejamento regionais. Segundo Büttenbender et al. (2011, p. 10):
“(...) percebe-se nitidamente que os mesmos foram criados num contexto que impregnou, desde os primórdios, sua forma de atuação, vinculando-a prioritariamente ao levantamento de demandas regionais para serem incorporadas ao orçamento estadual visando o atendimento das mesmas”.
E, embora os COREDES ainda atuem na elaboração dos Planos Estratégicos de Desenvolvimento Regional[20], muitos destes planos constituem-se em diretrizes sem nenhuma estratégia de aplicação ou destinação de recursos associada (NUNES, 2008). Segundo o autor, somente o COREDES-SUL, identificado como o conselho que elaborou o plano de pior qualidade, consegui avançar até uma articulação política capas de aplica-lo, o “Pacto Novo Sul”.
Nas analises realizadas por Veiga (2006), Dallabrida e Büttenbender (2008), esta precariedade reaparece, mas ela é relativizada por Dallabrida (2012) que salienta o processo lento de empowerment da sociedade e identifica como positivo o esforço do Fórum do Coredes em organizar entre 2009-2010 um processo de elaboração de Planos Estratégicos com o apoio das universidades federais e comunitárias, em todos os Coredes. Mesmo que este processo tenha tido níveis diferentes de engajamentos dos atores dos Coredes e que o produto final, os Planos Estratégicos, tenham tido qualidades muito diferentes em cada sub-região, trata-se de um passo importante na relação sociedade-governo.
Entretanto, como o próprio nome determina, os Coredes são Conselhos, e, portanto, são órgãos consultivos, sem capacidade operacional. Acreditamos[21], assim, que um melhor entrosamento do recorte Coredes com as novas formas de organização territorial intermunicipal, os consórcios públicos, é primordial para a efetiva tomada em consideração dos planos estratégicos sub-regionais.
O GRANDE ABC COMO ESPAÇO DE ARTICULAÇÃO METROPOLITANO-REGIONAL
A experiência de governança cooperativa conhecida como Fórum do Grande ABC corresponde ao segundo caso entendido como uma ação da sociedade civil e política local agindo para o desenvolvimento sub-regional, porém, à diferença dos Coredes, num perímetro territorial de características metropolitanas. Como salientado anteriormente, ainda que a Região do ABC possa ser interpretada como parte da área metropolitana de São Paulo, sua auto-organização como “região” confere um estatuto de escala sub-regional (2,5 milhões de habitantes distribuídos em 7 cidades) ou, pelo menos, metrópole independente.
A região conhecida como grande ABC representa uma zona mais ou menos homogênea. Nela reconhece-se uma matriz regional na cooperação sindical compartilhada (as estruturas sindicais metalúrgica e química do ABC), nas entidades empresariais de atuação regional (operadores de ônibus), no jornal de circulação regional (Diário do Grande ABC), assim como a existência de uma única liderança religiosa, o Bispo do Grande ABC (DANIEL e SOMEKH, 2013). Assim, neste contexto já “regionalizado”, o Fórum do Grande ABC, entidade civil criada em 1994 (institucionalizada em 1995) e associando 64 entidades representativas da sociedade civil aparece como resposta às dificuldades regionais[22] (KLINK, 2007).
A gênese do Fórum pode ser associada à necessidade percebida pela sociedade civil do pouco espaço político ocupado pela região. Assim, no momento de campanha às eleições gerais de 1994, um movimento intitulado “Vote no Grande ABC” apareceu para sensibilizar os eleitores dos sete municípios do consórcio a votarem em candidatos comprometidos com o desenvolvimento da região (NUNES, 2008). Segundo a autora (NUNES, 2008, p.53):
“A eleição de cinco deputados estaduais e cinco deputados federais como resultado dessa campanha levou os atores nela envolvidos a perceberam que era possível criar uma base regional mais consolidada e conceberam a ideia de construir uma sociedade regional, onde os problemas e anseios comuns às populações dos sete municípios pudessem ser compartilhados e buscados suas soluções pelo conjunto da sociedade”.
Em paralelo, duas estruturas (re) aparecem: o consórcio e a Câmara do grande ABC. Primeiramente, cabe lembrar que apesar das cidades de Diadema, Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul terem formado em 1990 o Consórcio Intermunicipal das Bacias do Alto Tamanduatéi e Billings[23], visando à gestão ambiental das bacias hidrográficas e o gerenciamento e destinação de resíduos sólidos, só foi a partir da instituição do Fórum e da mobilização da sociedade civil que esta estrutura foi reativada e ganhou força. Em um segundo momento, as lideranças políticas e sociais locais associam-se às lideranças da região no legislativo federal e ao governo do estado de São Paulo (por intermédio da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado) para construir uma estrutura de governança que integrasse todos os tipos de atores locais: a Câmara do Grande ABC.
Segundo Klink ET Al (2013, p. 4), diferente do Fórum do Grande ABC, onde predomina a sociedade civil na identificação das prioridades regionais, e do consórcio intermunicipal, onde predomina o executivo dos 7 municípios e onde ancora-se as instituições comunitárias, a câmara corresponde à:
“(...) uma plataforma participativa – contando com uma ampla mobilização da sociedade civil, além dos governos local e estadual - para a construção de uma agenda coletiva em torno do futuro do ABC”, (...) simboliza (assim)[24] o embrião de um novo modelo de ação coletiva nas regiões metropolitanas no Brasil.
A Câmara se articula horizontalmente com as entidades locais (patronais, sindicais, associativas), capazes de alavancar o desenvolvimento regional endógeno. Visto a raiz consorciada deste complexo de instituições cooperativas, as conexões horizontais, via associação intermunicipal, são muito fortes e constituem a base de funcionamento da Câmara.
Esta base intermunicipal é ao mesmo tempo a força e a fragilidade do conjunto. Cabe lembrar que desde a descentralização ocorrida gradualmente nos anos 80 (redistribuição fiscal) e reforçada pelo caráter municipalista da constituição de 1988, os municípios representam um espaço de gestão privilegiado. Eles tornaram-se assim responsáveis por grande parte das competências urbanas (habitação, saneamento e transporte) tendo suas receitas fiscais aumentadas.
Porém, observa-se que eles apresentam grande heterogeneidade financeira entre eles, resultante do poder de atração de investimentos privados e sua implicação na receita municipal via impostos como o Imposto Sobre Serviços - ISS - de qualquer natureza (ABRUCIO e COUTO, 1996). Assim, quanto mais investimentos privados, mais impostos e maior capacidade municipal, e por consequência intermunicipal, de reinvestimento em planejamento e gestão, resultando em projetos de desenvolvimento local. Porém, um esvaziamento das finanças municipais pode também esvaziar as finanças intermunicipais e sua capacidade de investimento nestas novas estruturas cooperativas.
Tentando resolver os problemas financeiros e evitar uma situação concorrencial entre as municipalidades integrantes, foi instituída a agência de desenvolvimento econômico do Grande ABC. Trata-se de uma associação Civil de Direito Privado, sem fins econômicos, integrando economicamente o Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, as Diretorias Regionais do CIESP, as Associações Comerciais Locais, os Sindicatos de Trabalhadores, as empresas do Polo Petroquímico e, a partir de 2001, as instituições de ensino superior da região.
Soma-se a esta articulação horizontal, uma ação verticalizada. Como visto anteriormente, ainda que “os consórcios e outras formas associativas intermunicipais potencializam as capacidades administrativas e financeiras de diversas municipalidades – antes dispersas” (ABRUCIO e COUTO, 1996, p. 45), a capacidade de reinvestimento fica comprometida se as receitas municipais são insignificantes. Por essa razão, de forma a buscar financiamento e apoio para viabilizar suas ações, a Câmara se articula também com o governo estadual e federal, tentando atrair investimentos e/ou estabelecer canais de cooperação e viabilização das ações locais.
Porém, como destacam Lépore ET AL (2006, p.5) mesmo que alguns avanços tenham sido feitos nos últimos 10 anos:
“Estas Agências e Fóruns de desenvolvimento regional representam inovações na gestão metropolitana que não são ainda reconhecidas pelas estruturas institucionais existentes do pacto federativo”.
A experiência do Grande ABC representa assim uma complexa rede de governança que tenta, através 4 instituições diferentes, atingir um dos principais objetivos do sistema federativo, a cooperação entre entes federados, ultrapassando a falta de textos orientadores e mesmo as auto- blocagens que apresenta o texto constitucional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Algumas lições podem ser tiradas das duas experiências analisadas e que explicam através dos caminhos trilhados por estas experiências, elementos que parecem condicionar o sucesso de novas experiências de cooperação e de desenvolvimento regional.
A primeira é a capacidade da sociedade civil em articular e auto-estruturar instâncias de discussão e de pressão para solucionar os problemas regionais. Os dois casos analisados mostram importantes avanços no desenho e na atuação destas estruturas. No caso dos Coredes, os conselhos conseguiram ocupar um espaço importante na Assembleia Legislativa estadual através do Fórum dos Coredes e conseguem manter sua ação em face de diferentes executivos e diferentes programas de governo, nem sempre simpáticos à utilização desta estrutura como forma de participação citadina. No caso do Grande ABC, a sociedade, através do Fórum, e a classe política fundam um desenho organizacional ancorado em 4 instituições para ultrapassar os elementos constitucionais pouco adaptados à cooperação, salientando as lacunas da estrutura legislativa federativa à cooperação territorial. Sua atuação resulta, finalmente, no reconhecimento de vazios importantes na constituição e, portanto, na institucionalização da estrutura consorciada de direito público, que recebeu Lei própria em 2005. Deste modo, a pré-existência de capital social local parece condição primordial ao empowerment local.
Referente à capacidade de realização de projetos regionais, algumas demandas do Grande ABC acabaram tendo resposta na metade dos anos 2000, com investimentos em infraestrutura, ainda que parciais, e a instituição da Universidade Federal do Grande ABC, visto como um elemento essencial para a retomada do crescimento endógeno da região. Da mesma forma, a atuação dos Coredes reforçou a compreensão das disparidades territoriais e conseguiu a atenção federal através das ações de financiamentos especial via PROMESO, com destaque às mesorregiões “Metade Sul” e “Fronteira do Mercosul”. Merece também destaque o reconhecimento da formação de capital humano para o desenvolvimento regional, culminando também na instituição de duas universidades Federais: a Universidade Federal da Fronteira Sul e a Universidade Federal do Pampa. Assim, a solicitação da sociedade local e o retorno positivo do governo federal em termos de instituições federais permite identificar, tanto da parte de uma como de outra instância, a compreensão pelos atores da importância da capacitação humana no desenvolvimento endógeno.
Verifica-se também que o sucesso dos dois casos está fortemente vinculado à importância da matriz regional para o fortalecimento das ações de pressão da sociedade civil. Em ambas as experiências, a matriz regional já estava presente e foi estruturada de baixo para cima pelos próprios atores locais. Assim, o nível de adesão da sociedade à suas características regionais (identificando tanto fragilidades quanto potencialidades) é maior e mais homogênio, gerando maior pressão no atendimento à suas demandas.
Porém, esta análise identificou também vários obstáculos aos quais estas experiências fracassaram ou fizeram face. Inicialmente cabe lembrar o escasso espaço destinado na constituição federal a novos perímetros de governança. O federalismo brasileiro se estruturou de forma muito rígida e legou a textos complementares, ainda incipientes ou inexistentes, a organização de outras formas de governabilidade tais como as áreas metropolitanas e as cooperações intermunicipais (ARRETCHE, 2000). Ainda não existe um texto que determine de forma clara as relações entre entes federados, nem de como as cooperações entre estes e as estruturas de governança civis devem ser estruturadas. O vazio, deixado a iniciativa dos próprios atores infelizmente têm caracterizado as ações públicas como mero resultado da articulação política, que atua antes priorizando a ascensão políticas dos atores que priorizando uma verdadeira organização entre entes federados (ARRETCHE, 2000).
Além do mais, em muitos casos os atores políticos das escalas federais autônomas sentem-se ameaçados pela instituição de novos perímetros de governança territorial, dificultando sua criação e sobrevivência institucional. Entende-se, assim, que as duas experiências só conseguiram avançar quando os executivos federais apoiavam ou reconheciam a importância na interface sociedade-governo. Em momentos onde o apoio não era presente, estas experiências lograram, entretanto, o fato de sobreviverem em ambiente “hostil”[25].
Como estas experiências inovam tanto na forma de tratar o problema do desenvolvimento regional como na sua própria estrutura interna, persistem problemas de comunicação e integração com os entes federados, rigidamente organizados de forma setorializada. Assim no caso dos Coredes, existem grandes dificuldades de articulação da escala mesorregional, que é a escala intrínseca das características sociais e econômicas sub-regionais, com as escalas federativas municipais e estaduais. Cabe ressaltar, que no caso ABC a existência de várias estruturas de caráter regionalizado e a existência de um consórcio intermunicipal cujo perímetro equivale ao perímetro sub-regional, facilitaram as conexões.
Independente das dificuldades apresentadas cabe evidenciar que a existência destas experiencias muito colaborou para inserir os problemas regionais identificados pela sociedade civil na agenda de governantes. As dificuldades às quais elas fizeram face não somente serviram de termômetro de desequilíbrios regionais ou de importantes vazios legislativos, mas acabaram por resultar em textos legislativos ou políticas regionalizadas. Segue assim a certeza de que as novas experiências cooperativas lograrão de alguns avanços já conseguidos pelo duro caminho percorrido por estas duas experiências.
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[1] Em seguida mais quatro cidades: Rennes, Clermont-Ferrand, Dijon e Nice
[2] Paris et le désert français de Jean-François Gravier (1947).
[3] A estratégia atingiu seus objetivos, distribuindo parte das atividades industriais, mais principalmente as atividades metropolitanas – terciário superior – entre as novas capitais. Entretanto, estas atividades ficaram concentradas nas capitais e cidades integrantes da sua área de abrangência, deixando as regiões não fortemente urbanizadas numa situação econômica precária. Situação que fundos espaciais europeus, tais como o FEDER (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional), vieram posteriormente contemplar.
[4] Délégation Interministérielle à l Aménagement du Territoire et à l Atratividade Régionale (DATAR) foi uma administração francesa, criada em 1963 no governo Georges Pompidou, para trabalhar de forma integrada as ações do Ministère de l Espace rural et de l Aménagement du territoire, através do chamado comité interministériel de ordenamento e de développement du territoire (CIADT).
[5] O Brasil não possui uma polarização, mas estrutura sua economia em torno de 3 polos ou “capitais”. A antiga capital nacional, Rio de Janeiro, guarda certa importância administrativa (continua sede de certas empresas governamentais e de capital privado) e consular; além de ser indiscutivelmente a capital turística do país. A capital administrativa é, desde 1960, Brasília. A construção da capital ajudou a ocupar a região centro-oeste do país e conseguiu formar uma rede de influência extremamente importante sobre as cidades vizinhas, tendo em vista seus 50 anos de existência. E é inegável a importância econômica da cidade de São Paulo, berço da sociedade capitalista brasileira e da industrialização. Ela concentra a maior parte das sedes de grandes empresas e conglomerados internacionais.
[6] Segundo o IBGE, entre 1901 e 2000, a população brasileira saltou de 17,4 para 169,6 milhões de pessoas.
[7] A Lei n° Lei 11.107/2005 – Lei Federal dos Consórcios Públicos que estabelece as regras para criação dos consórcios públicos só foi aprovada em 2005. Antes dela, a criação das áreas metropolitanas foi definida pela Lei complementar nº 14, de 8 de junho de 1973, que estabeleceu as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza (regime autoritário). Posteriormente a constituição de 1988 atribuiu aos estados federados esta responsabilidade.
[8] A titulo de exemplo, a região metropolitana do Rio de Janeiro espalha-se sobre uma superfície territorial que alcança até 8 147,356 km² e uma população de 12 116 616 habitantes, ou seja 1/5 da superfície do estado fluminense mas comportando ¾ da população do estado.
[9] Região que inicio o movimento pró-separação e instituição de um novo pais.
[10]Um mecanismo muito utilizado no período de governo federal neoliberal foi a tentativa dos executivos estaduais de desenvolverem seus estados através da atração de grandes indústrias. Esta estratégia se baseava no mecanismo de renuncia fiscal e era completado, muitas vezes, por facilidades maiores como a construção das infraestruturas e a doação do terreno para a empresa multinacional que optasse por se instalar numa certa localidade.
[11]Desde o século XIX percebe-se algumas políticas regionais pontuais na região nordeste, destinadas à reduzir o impactos das secas.
[12] Superintendência de desenvolvimento do Nordeste, tendo à frente umas das personalidades que mais elaborou o discurso da desigualdade brasileira, o economista Celso Furtado, e as ideias que ele elaborou ao longo de sua experiência na Comissão Econômica para a América Latina (Cepal).
[13] BRASIL_b.
[14] Amazônia (Alto Solimões, Bico do Papagaio e Vale do Rio Acre); do semiárido nordestino (Xingó, Chapada do Araripe e Chapada das Mangabeiras); e do restante do País tais como Vale do Ribeira, Vale do Jequitinhonha, Metade Sul do RS, Águas Emendadas, Bacia do Itabapoana.
[15] Cabe ressaltar que estas estruturas, francesa e brasileira, foram criadas com 30 anos de diferença e portanto baseadas sob paradigmas de administração publica completamente diferentes.
[16] Precisamos que as analises feitas são referentes a estes dois estudos de caso precedentemente citados. Apesar de múltiplas experiências de cooperação e de descentralização do poder político-administrativo brasileiro, concordamos com Dallabrida (2012, p.2) de que “Não é possível generalizar as avaliações feitas sobre as experiências de descentralização no Brasil. Tem experiências com mais de 20 anos de continuidade, que, apesar de ainda não terem superado alguns desafios, apresentam potencialidades para avançarem; outras iniciaram com bons propósitos na década de 1990, mas sofreram interrupção a partir dos primeiros anos do século XXI; em algumas delas, há mais autonomia da sociedade em relação ao Estado; outras, foram implantadas sob a articulação direta de governos estaduais, com níveis restritos de participação social; outras ainda, foram implantadas na gestão de um Governo Estadual, não tendo continuidade no período de governo seguinte”.
[17] Como por exemplo, o Conseils Economiques et Sociaux Régionaux (CERS – escala departamental) ou o Conseil de Développement (CD – escala intermunicipal) franceses, que possuem, à semelhança dos Coredes, uma função consultiva face as lideranças políticas locais.
[18] Pois os Coredes integram diferentes escalas de gestão (articulação vertical com o governo do estado via Fórum Coredes e com o governo federal via Ministério da Integração) e diversas municipalidades (articulação horizontal).
[19] Esta mudança de perfil se deu exatamente no contexto de tomada do executivo gaucho pelo grupo de partidos da Frente Popular, que institui instâncias diretas de consulta popular (via orçamento participativo), sem passar pela estrutura já existente do Coredes.
[20] Segundo Rorato e Lahorgue (2011), 14 das 24 regiões COREDES analisadas realizaram um Plano Estratégico.
[21] Concordamos com as impressões de Dallabrida e Büttenbender (2008); Dallabrida e Zimmermann (2009).
[22] No ano de 1999 o Fórum chega a 108 entidades.
[23] Este consórcio foi fundado em 1963 como um consórcio setorial visando melhorar o fornecimento de água e a gestão dos problemas ambientais. Entretanto, a criação em 1965 da companhia estadual de águas e esgotos, faz que esta primeira estrutura consorciada desapareça, sendo reativada somente em 1990 sob o nome de Consocio Intermunicipal da Bacia do Alto Tamandanduateí e Billings (ABRUCIO e SOARES, 2001).
[24] Griffo nosso.
[25] Referimos-nos aqui ao período de governo estadual gaúcho liderado pela Frente Popular. A coligação de partidos mostrou grande interesse nos processos de participação da sociedade civil no governo estadual. Porém, não reconhecia nos Coredes o papel de articulador entre governo e sociedade, optando por políticas de participação orçamentária organizada diretamente com a população.
AVALIAÇÃO DO FLUXO DE VEÍCULOS, DENSIDADE CALORIMÉTRICA E OCORRÊNCIA DE DOENÇAS CARDIOVASCULARES E RESPIRATÓRIAS EM BARREIRAS-BA.
Pollyana Ferreira da Silva¹
Andréia Porto de Souza[1]
Prudente Pereira de Almeida Neto[2]
Roberto Bagattini Portella[3]
RESUMO
Este estudo realiza uma análise dos fatores climáticos que afetam a qualidade ambiental e urbana, através da avaliação do fluxo veicular no centro da cidade anterior e posterior a implantação do contorno viário, avaliação das ocorrências de doenças cardiovasculares e respiratórias relacionadas à poluição do ar e medição da densidade calorimétrica utilizando-se a Escala Ringelmann. O objetivo desta pesquisa foi estudar as correlações entre as informações obtidas, averiguando nesta situação específica a qualidade ambiental do espaço urbano de Barreiras.
Palavras-chave: Poluição Veicular, Doenças Respiratórias e Cardiovasculares, Qualidade do Ar.
INTRODUÇÃO
Historicamente a corrida para o progresso compreendendo o desenvolvimento tecnológico e industrial acarreta inúmeras consequências na qualidade de vida humana. Nesta linha do tempo deste processo histórico, um dos ambientes que mais tem sofrido danos é o atmosférico, haja vista a intensa ascensão das emissões veiculares que associados a fatores meteorológicos tornam-se agravantes para a saúde humana. Esse tipo de poluição é potencializado com o aumento da frota veicular e aliado às mudanças climáticas, levando-se em consideração determinadas condições de temperatura do ar, pressão e umidade, podem permitir uma concentração relevante de poluentes em suspensão na atmosfera, determinando assim um ambiente urbano poluído.
Nesta azáfama de agressão ao meio físico, são inúmeros os poluentes lançados rotineiramente, o que provavelmente provoca reações físico-químicas capaz de desencadear diferentes contaminantes em contato com o meio atmosférico, assim a atenção para essa forma de poluição deve ser vista como um algo inerente à saúde da população, não devendo, dessa maneira, passar como algo irrelevante ou como impacto insignificante.
Dessa maneira, as alterações ambientais causadas por processos antrópicos tendem a produzir modificações em alguns elementos climáticos, originando fenômenos como o das “ilhas de calor” [4], responsáveis por temperaturas mais elevadas na área central da cidade, além de pluviosidade quantitativamente concentradas nas áreas urbanizadas. Nesta sequência de eventos o fenômeno da urbanização pode alterar a dispersão e remoção dos poluentes através das condições regionais do clima (velocidade, direção dos ventos, precipitação), e também das características da cidade (topografia, construções, impermeabilização, arborização) (TORRES et al. 2005 apud MARTINS 1996).
Aliado a esta sequência de alterações temos: os agravantes da poluição atmosférica, os poluentes gasosos e o material particulado que pode ser inalado, provocados através da queima de combustíveis fósseis que apresentam efeitos diretos sobre o sistema respiratório e cardiovascular. Tais efeitos maléficos têm sido registrados a partir do aumento nos atendimentos e internamentos em pronto-socorro e hospitais conforme discutido por Braga et. al 2007.
Além da poluição atmosférica, o crescimento desordenado em cidades de médio e grande porte podem desencadear outros problemas urbanos ambientais, como consequência do aumento da malha urbana, da verticalização e do uso intensivo do solo nas áreas centrais, além da: excessiva impermeabilização, substituição de áreas verdes por áreas construídas, o que coletivamente desencadeiam em cidades com reduzida qualidade ambiental (GOMES e LAMBERTS 2009).
Os efeitos descritos em tela corroboram para o caso do município de Barreiras-BA, que é uma importante rota de transporte de cargas, pois liga o extremo oeste da Bahia a estados como Piauí, Goiás, Tocantins e Distrito Federal. Destacamos que no seu perímetro urbano passam as rodovias federais 242 e 135, nas quais o tráfego de caminhões pesados circula utilizando-se preferencialmente do contorno viário que foi liberado em fevereiro de 2014. Esta rota utilizada conflita com o fluxo de automóveis da cidade e a intensidade de seu uso, que corta áreas habitadas. Situação esta que produz um ambiente propício para a poluição veicular (fortemente incrementada por veículos a diesel), derivada do aumento do tráfego, da aglomeração de pedestres. Todos estes fatores, associados à dimensão espaço-temporal, consequentemente, diminuem a qualidade ambiental e a qualidade de vida das pessoas, tornando o espaço urbano um ambiente insalubre e perigoso.
OBJETIVOS
O presente trabalho tem por objetivo geral avaliar a qualidade ambiental urbana de Barreiras-BA através das correlações existentes entre o fluxo de veículos, a densidade calorimétrica e a ocorrência de doenças cardiovasculares e respiratórias no município de Barreiras-BA.
Os objetivos específicos que irão consolidar o objetivo geral consistem em: mapear o fluxo de veículos no perímetro urbano de Barreiras, identificar doenças cardiovasculares e respiratórias recorrentes relacionadas à poluição veicular no atendimento público da cidade, caracterizar a fumaça veicular, avaliar a alteração do fluxo de veículos após o funcionamento do contorno viário. Para assim, identificar possíveis interferências que a poluição do ar e o fluxo intenso de veículos, podem estar impactando na qualidade de vida da população.
ÁREA DE ESTUDO
O estudo foi realizado na cidade de Barreiras, região Oeste da Bahia, que segundo dados do IBGE (2014) o município tem uma população estimada de 152.208 habitantes. Para esta pesquisa foram considerados o quantitativo de veículos que trafegam no perímetro urbano do município, as ocorrências de doenças no município dos internamentos e tratamentos feitos no hospital regional e unidades básicas de saúde, conforme censo de saúde destes estabelecimentos.
O ponto para coleta de dados do fluxo de veículos situa-se na rodovia 242 na esquina com a Rua Barão de Cotegipe, rodovia esta que corta a cidade em suas duas extremidades. Para a caracterização da fumaça dos veículos, coletaram-se os dados na rodovia BR-242 esquina com a Rua Silva Jardim.
METODOLOGIA
A pesquisa realizada tem natureza exploratória, pois utiliza o ambiente urbano como base de exploração para suas inferências sobre a qualidade ambiental e conhecimentos para aplicação prática e tomada de decisões locais. Neste contexto a abordagem do problema avaliado tem características qualitativa e quantitativa, pois se tem uma análise dados indutivamente e descrevendo as características peculiares dos problemas levantados, assim como, uma análise numérica dos dados, através de contagens e médias.
Em relação ao seu objetivo, a pesquisa se caracteriza por ser descritiva, através da utilização de técnicas de coleta de dados, como contagem, observação sistemática, tabulação e utilização de técnicas de medição consolidadas.
A pesquisa foi desenvolvida em várias etapas sendo: levantamento de ocorrências de doenças cardiovasculares e respiratórias na secretaria de saúde do município e hospital regional referente aos anos de 2012 e 2013, contagem de veículos em 2013 e 2014 e caracterização da fumaça de veículos diesel em 2014.
Para o levantamento das ocorrências das doenças, foi solicitado a Secretaria de Saúde do município e a direção do hospital regional as ocorrências de doenças relacionadas pelo grupo de pesquisa após consulta a literatura das doenças relacionadas à qualidade do ar. De posse dos dados, estes foram tabulados e analisados conforme a literatura disponível, avaliando a recorrência de doenças e sua relação com qualidade do ar.
Figura 01: Mapa da cidade de Barreiras com as rodovias que a interceptam e as suas principais saídas.
Fonte: Adaptado Google Maps.
A contagem dos veículos foi realizada de maneira manual em planilhas pré-elaboradas, no período de 14 a 20 de abril de 2013 e 10 a 17 de abril de 2014, sempre das 6 às 8hs e das 17 às 19hs. Foram contados caminhões carregados, caminhões descarregados, automóveis, ônibus, camionetes e utilitários. A diferença dos caminhões carregados e descarregados foi considerada, atendo-se ao fato de que os caminhões carregados emitem mais poluentes do que os descarregados por estarem mais pesados e necessitarem maior força trativa para se locomoverem.
O instrumento de pesquisa utilizado para realizar a caracterização da fumaça dos veículos foi a Escala Ringelmann, escala gráfica que permite avaliar a densidade calorimétrica da fumaça, formada por seis padrões com variações de tonalidade entre o branco e o preto (KÖNIG, 2000). Aplicando-se a metodologia segundo a norma da Associação Brasileira de Normas Técnica-ABNT NBR 6016:1986. Neste diapasão, através da observação e comparação do ponto de escapamento do veículo mediu-se o grau de enegrecimento da fumaça expelida através da escala a seguir (Figura 02):
Figura 02: Aplicação da Escala Ringelmann.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
IDENTIFICAÇÃO DO FLUXO DE VEICULOS E A QUALIDADE DE VIDA
Segundo Santos et. al (2006), o crescimento das cidades e o desenvolvimento do modal de transportes rodoviário têm contribuído para o desenvolvimento econômico-social, entretanto a falta ou ineficácia do planejamento urbano de transportes, aliado ao crescimento desordenado dos centros urbanos, veem configurando cenários não muito adequados, pelo aumento dos índices de concentração de poluentes, redução da mobilidade, ocupações irregulares, dentre outros fatores. Desta forma a qualidade de vida da população fica comprometida principalmente quando nestas cidades o fluxo de veículos pesados interage diretamente com os fluxos urbanos na rede viária principal e sem infraestrutura necessária.
Em Barreiras o fluxo de veículos se caracteriza pelo tráfego de automóveis, caminhões carregados e descarregados, ônibus, camionetes e utilitários. Através da contagem feita em abril de 2013 e abril de 2014, estimou-se que o fluxo de veículos se comporta, semanalmente, nos horários de 6 ás 8h e das 17 ás 19h, como demonstrado o Gráfico 01.
Analisando o fluxo de veículos no Gráfico 01, pode-se verificar que ocorreu uma alteração significativa do quantitativo de caminhões que passavam no centro da cidade após o funcionamento do contorno viário, que passaram a trafegar no entorno da área central da cidade. Atualmente, os caminhões que trafegam no centro da cidade são apenas aqueles que estão fazendo descargas, carregamentos, em conserto ou estão trafegando de forma irregular.
Quanto aos automóveis, houve um aumento no fluxo entre 2013 e 2014 muito significativo (mais de 18%), acarretando numa maior aglomeração de carros nas vias, falta de estacionamentos, maior contribuição de emissão de poluentes, elevação do indicies de acidentes (Figura 03). Estes fatores contribuem diretamente na qualidade de vida da população.
Segundo Saback et al [s.d], o crescimento acelerado da cidade e o aumento no número de transportes individuais, vem causando uma série de impactos aos cidadãos, provocando uma desorganização dos espaços, e, consequentemente um conflito que acarreta significativos danos a qualidade de vida e mobilidade para os usuários. Esse fenômeno pode estar acontecendo em Barreiras, de modo que podemos preliminarmente prever a real necessidade do município rever seu Plano Diretor Urbano (PDU-2004) na perspectiva de tomar decisões políticas onde se privilegie os pedestres, ciclistas e o transporte coletivo. Nesse sentido, é notória a necessidade de melhorar não só a mobilidade urbana, mas também reduzir as emissões de poluentes veiculares, diminuir os engarrafamentos que geram stress nos condutores, diminuir o índice de acidentes e, consequentemente, impactar positivamente na qualidade vida e ambiental urbana da cidade.
ALTERAÇÃO DO FLUXO DE VEÍCULOS
O complexo viário que orienta o fluxo do tráfego no espaço urbano de Barreiras tem como principal via de acesso a BR-242, a qual, enquanto via arterial, corta este espaço no sentido leste - oeste. Esta distribuição viária orientou historicamente que os principais estabelecimentos de comércio e serviços públicos dentre outras atividades se consolidasse a margem desta artéria. Assim, boa parte dos produtos que chegam à cidade, ou mesmo viajantes que passam pela cidade, transitam sobre a rodovia BR-242 no perímetro urbano do município, além dos veículos de residentes que tem fluxo constante na via citada e em seu entrono.
Recentemente o fluxo mais intenso de cargas pesadas foi alterado do centro da cidade para seu entorno, através do contorno viário que passou a funcionar em fevereiro de 2014. Como demonstram os dados coletados pela pesquisa realizada em abril de 2013, constatou-se em média um fluxo semanal, entre às 6 e ás 8hs e das 17 ás 19hs, de 384 caminhões carregados, 192 caminhões descarregados, 1759 automóveis, 696 camionetes e utilitários, 185 ônibus. Já em abril 2014, nos mesmos horários, verificou-se um fluxo semanal médio de 76 caminhões carregados, 25 caminhões descarregados, 1083 automóveis 774 camionetes e utilitários, 178 ônibus. É perceptível a redução do fluxo de caminhões na área central da cidade, o que pode ter alterado significativamente a qualidade do ar nesta região. Por outro lado, a mudança deste tipo de fluxo veicular para outra região da cidade, mesmo com menor concentração de pedestres e transeuntes, pode ter simplesmente transferido o problema de local, dentro da mesma área urbana, permanecendo, desta forma, a vulnerabilidade de pedestres e transeuntes que inalam a fumaça e poluentes.
Figura 03: Fluxo de Veículos.
Segundo Torres e Martins (2005), os fenômenos de dispersão e remoção dos poluentes são causados principalmente pelas condições regionais do clima (velocidade e direção dos ventos, precipitação), e também pelas características da cidade (topografia, construções, impermeabilização, presença de áreas verdes). Sobre o aspecto de construções, os poluentes, a fumaça e material particulado emitido pelo fluxo de veículos no contorno viário poderá ter condições mais favoráveis para a dispersão, pois é uma área com menor adensamento populacional do que o centro da cidade, onde a grande maioria das construções são de até dois pavimentos. Porém, devem-se controlar as emissões, pois a área se caracteriza como uma nova área de expansão alocando programas de habitações populares, novos loteamentos e setor industrial, que podem contribuir com novas variáveis a mesma problemática, já bastante acentuada diante da ausência do planejamento urbano.
CARACTERIZAÇÃO DA FUMAÇA
Através de um ensaio realizado nos dias 10, 12,14 e 16 de abril de 2014 com o uso da Escala Ringelmann, foi medido o grau de enegrecimento da fumaça emitida por veículos de motor diesel que trafegam no centro da cidade. No ensaio realizado em dias alternados durante uma semana, das 8 às 9hs, foram obtidos os seguintes resultados: 1º dia uma média de 49,65% de densidade calorimétrica em 29 veículos, sendo 10 camionetes, 8 ônibus, 10 caminhões e 1 utilitário; 2º dia uma média de 43,03% de densidade calorimétrica em 33 veículos, sendo 12 camionetes, 16 ônibus, 3 caminhões, 2 utilitários; 3º dia uma média de 59,10% de densidade calorimétrica em 67 veículos, sendo 24 camionetes, 26 ônibus, 13 caminhões, 4 utilitários; 4º dia uma média de 47,52% de densidade calorimétrica em 109 veículos, sendo 56 camionetes, 25 ônibus, 25 caminhões, 3 utilitários.
Após a coleta e interpretação dos dados apresentados, observamos que o dia de maior concentração de fumaça é o terceiro (segunda-feira). Este aspecto pode estar relacionado ao fato de Barreiras a maior cidade do Oeste Baiano, onde concentra a base de comércio e serviços regionais que atraem pessoas de cidades satélites da sede do município, assim como, o fluxo decorrente da ligação do extremo oeste da Bahia a outros estados como Piauí, Tocantins, Goiás e o Distrito Federal parece concentrar-se, também, nas segundas feiras. Desta forma, esse alto índice de exposição à fumaça pode estar relacionado as características peculiares que o município apresenta, fazendo-se necessário monitoramentos da qualidade do ar em outros pontos de maior movimentação veicular e adensamento populacional.
Resgatando a PORTARIA Nº 38 DE 01 DE ABRIL DE 2014 do DEPARTAMENTO NACIONAL DE TRÂNSITO – DENATRAN, para sua tradução literal, temos que, será permitida a emissão de fumaça até a tonalidade igual ao padrão do número 2, ou seja, 40% de densidade calorimétrica da escala Ringelmann para altitudes de até 500 metros e para altitudes superiores a 500 metros, admite-se o padrão 3 (três) 60%. E o veículo que expelir fumaça superior a esses padrões, será retido, até regularização, e imposta à multa conforme estipulado no Artigo 231, item 3 do Código de Trânsito Brasileiro. Como o município de Barreiras tem uma altitude de 452 m, se enquadra no primeiro critério. Assim, avaliando as médias das densidades obtidas nas medições, pode-se concluir que em todos os dias as médias de emissões dos veículos pesquisados ultrapassaram o limite permitido. Desta forma, é importante que os órgãos de trânsito e meio ambiente fiscalizem os veículos e regulamentem os padrões de emissão no município.
Segundo Guimarães (2004), a fuligem originada na combustão dos motores a diesel contém compostos de carbono. Sendo que mais de 95% destes particulados sólidos têm tamanho inferior a 1 micrômetro (μm), facilitando sua inalação e penetração nos pulmões.
Guimarães (2004) também conclui que é possível compreender porque as emissões de diesel oferecem sérios riscos para a saúde pública. Pela coleta de dados mais recente, já está comprovado que as populações que se encontram na “rota do diesel” [1], ou seja, aquelas pessoas que moram e/ou trabalham em avenidas ou nas proximidades de autopistas e estradas movimentadas, apresentam problemas respiratórios e índices de câncer de pulmão em maior quantidade do que aquelas que estão longe de tais áreas.
Infere-se desta maneira que se faz necessário fiscalizar as emissões dos veículos que trafegam no município, para que se tenha menor impacto sobre a saúde e bem estar da população. Assim como, diagnosticar as ocorrências de emergência para que se possa aprofundar os estudos acerca da relação “poluição do ar versus doenças respiratórias e cardiovasculares”, a fim de que se tenha dados que justifiquem não só a remediação das patologias, mas também, e principalmente, a prevenção através de políticas públicas na área ambiental, infraestrutura, saúde e educação no trânsito.
OCORRÊNCIA DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS E CARDIOVASCULARES
Segundo Braga et. al (2007), os poluentes gasosos e o material particulado inalável formados pela combustão de combustíveis fósseis têm efeitos danosos diretos sobre o sistema respiratório. Esses efeitos têm sido notificados através de aumento nos atendimentos de pronto-socorro e hospitais. Assim, a poluição atmosférica tem sido classificada como um grave problema de saúde pública.
Segundo Martins (2004), ilhas de calor repetindo um processo de dispersão de poluente constante entre ar quente e frio e, consequentemente, os efeitos de exposição constante a esses poluentes podem ocasionar doenças tais como diminuição das funções pulmonares, diminuição da variação de batimentos cardíacos, assim como o aumento da medicação de asma.
Nesse sentido, foram coletados dados do atendimento de unidades básicas de saúde e hospital regional, porém apenas observando-se ocorrências de tratamento e internações por doenças cardiovasculares e respiratórias da população da cidade (Gráfico 02).
Durante a pesquisa, na fase da coleta de dados, na Secretaria de Saúde do Município e Hospital Regional, relatou que se tem dificuldade em diagnosticar o paciente em atendimentos de emergência, de maneira que muitas vezes o paciente atendido com doenças respiratórias de menor risco não entra no banco de dados das instituições. Desta maneira a pesquisa considerou apenas os dados das internações e tratamentos realizados para tratar as doenças respiratórias e cardiovasculares.
Diante desta dificuldade que o município tem em registrar casos de doenças respiratórias e cardiovasculares, acrescenta-se mais um problema para a gestão pública: a falta de dados para comprovar a necessidade de investimento público mais direcionado para estas áreas da saúde. De maneira que a população muitas vezes recebe um tratamento paliativo, em vez de ser tratada com a infraestrutura adequada para a patologia, ficando refém outra vez da ausência de planejamento.
A partir deste quadro, considerando as ocorrências mais expressivas nesta análise pneumonias ou influenza em 2012 e 2013, demonstram uma porcentagem muito pequena considerando uma população de 152.208 habitantes IBGE (2014), pois além da dificuldade do diagnóstico fechado na emergência, segundo Guimarães (2004) apud Holgate et al, 2002, estudos mostram que a exposição a concentrações baixas de emissões de diesel levam ao aparecimento de inflamações no trato respiratório e que tais sinais clínicos não são detectáveis por exames e testes funcionais respiratórios tradicionais. Sendo mais uma dificuldade para a detecção de doenças respiratórias relacionadas à poluição por emissão de particulados.
De acordo com os dados obtidos é possível ratificar a ocorrência de doenças respiratórias, principalmente de pneumonias e influenza que podem ter relação com as condições meteorológicas e de qualidade do ar. Pois, segundo Guimarães (2004) apud AGENDA 21, o material particulado emitido pela queima do diesel vem sendo associado ao aumento das internações e mortes por doenças respiratórias.
Exploraram-se também os dados fornecidos que indicam as ocorrências de doenças cardiovasculares, tendo como as principais ocorrências o infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, crise hipertensivos. Tais doenças segundo a literatura podem ter sido provocadas ou agravadas pela poluição atmosférica causada pela queima de combustíveis (Gráfico 03).
Outros estudos indicam que as partículas finas dos poluentes do ar estão associadas principalmente com uma maior morbidade e mortalidade cardiovasculares. Isto é causado pela exposição das aos particulados da poluição automotiva que causam uma vasoconstrição das artérias e vasos capilares, reduzindo o fluxo sanguíneo e a oxigenação ao coração (GUIMARÃES, 2004).
Diante das ocorrências identificadas das doenças respiratórias e cardiovasculares, o município apresentou expressivamente doenças que, segundo a literatura, estão relacionadas com a poluição veicular. Assim é evidente que a gestão pública municipal deve promover pesquisas e ações que promovam a qualidade de vida, através de uma melhor gestão da área da saúde, planejamento urbano, adequação do trânsito, inspeção veicular e medições de qualidade do ar.
CONCLUSÃO
Tendo em vista os aspectos observados, a qualidade ambiental urbana deve ser avaliada de várias formas, principalmente com relação às variáveis constatadas referentes à qualidade do ar e a intensidade de ritmo da trafegabilidade acentuada junto ao meio físico destes espaços. Impulsionada pela frota de veículos que trafegam sem nenhuma preocupação ambiental por parte do poder público (em fiscalizar), ou mesmo dos condutores (em se adequar aos padrões de emissão) sobrecarregando os espaços urbanos.
Desta maneira, apesar do município de Barreiras se caracterizar como capital regional e, assim, por constituir um importante município para o oeste baiano, suas ações públicas para melhoria da qualidade de vida da população, com relação à qualidade do ar, são precárias e ineficazes.
Nesta diapasão, recomendamos a realização de ações que priorizem a saúde e a qualidade ambiental descritas a seguir:
A partir destas intervenções será possível principalmente planejar e avaliar a necessidade de criação de um Programa de Monitoramento da Qualidade do Ar, assim como, traçar as prioridades da política na área da saúde e meio ambiente no município. Diante do exposto esta pesquisa permite concluir que com pequenas observações no limite dos espaços urbanos, há condições objetivas da academia cumprir suas obrigações sociais perante os problemas que afetam a região em perfeita interatividade com a necessidade de se ordenar uma cidade com melhor qualidade de vida para a população.
REFERÊNCIAS
1. BRAGA, A.L. F.; PEREIRA, L. A. A.; PROCÓPIO, M.; ANDRÉ, P.A. de; SALDIVA, P. H. do N. Associação entre poluição atmosférica e doenças respiratórias e cardiovasculares na cidade de Itabira, Minas Gerais, Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 2007.
2. GOMES, P. S.; LAMBERTS, R. O estudo do clima urbano e a legislação urbanística: considerações a partir do caso Montes Claros, MG. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 9, n. 1, p. 73-91, jan./mar. 2009.
3. TORRES, F. T. P.; MARTINS, L. A. Fatores que influenciam na concentração do material particulado inalável na cidade de juiz de fora (MG). Caminhos de Geografia - revista On Line, out/2005.
4. GUIMARÃES, J. R.P. DE F. Toxicologia das emissões veiculares de diesel: um problema de saúde ocupacional e pública. Revista de Estudos Ambientais, v.6, n.1, jan./abril 2004, p. 82-94.
5. BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE 2014. Disponível em: . Acesso em: 18/02/2015.
6. BRASIL. Associação Brasileira de Normas Técnicas-ABNT. NBR 6016: 1986. Gás de escapamento de motor Diesel - Avaliação de teor de fuligem com a escala de Ringelmann.
7. BRASIL. Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN. PORTARIA Nº 38 DE 01 DE ABRIL DE 2014. Os limites de emissões de gases e os procedimentos para a fiscalização de veículos do ciclo diesel e do ciclo Otto, motociclos e assemelhados do ciclo Otto, conforme a Resolução CONTRAN n° 452, de 26 de setembro de 2013.
8. BARREIRAS. Plano Diretor Urbano de Barreiras. LEI N º 651/2004, de 16 de novembro de 2004.
9. SANTOS, N. C.; FARIA, C. A. e SILVA, A. T. B. da. A simulação do fluxo de veículos pesados em cidades de pequeno porte como um instrumento de planejamento. 2º Congresso Luso-Brasileiro para o Planeamento Urbano, Regional, Integrado e Sustentável. Braga-Portugal, 2006.
10. SABACK JÚNIOR, V. de O.; SANTANA, L. C. de. Mobilidade urbana em salvador e sua relação com a qualidade de vida. Faculdade Visconde de Cairu, Salvador-Ba [s.d].
11. MARTINS, L.C. Efeitos da poluição do ar e dos fatores meteorológicos nas doenças cardiovasculares na Cidade de São Paulo. Universidade de São Paulo; São Paulo, 2004.
12. LUCENA, A. J. de. Notas conceituais e metodológicas em clima urbano e ilhas de calor. Revista Continentes (UFRRJ), ano 2, n.2, 2013.
13. KÖNIG, G. A. Comparação entre a escala Ringelmann e a quantidade de material particulado emitida por motor diesel. Florianópolis-Santa Catarina, setembro, 2000.
[1] Graduandas em Engenharia Sanitária e Ambiental – Universidade Federal do Oeste da Bahia
[2] Professor Doutor Associado do Centro das Humanidades - Universidade Federal do Oeste da Bahia
[3] Professor Doutor Adjunto do Centro Multidisciplinar de Bom Jesus da Lapa – Universidade Federal do Oeste da Bahia.
[4] “Ilha de Calor”: Significa o nível de calor das áreas urbanas, quando comparadas a áreas não urbanizadas e normalmente refere-se ao aumento na temperatura do ar (LUCENA, 2013).
[5] “Rota do Diesel”: Compreende as áreas próximas a autopistas ou rodovias (GUIMARÃES, 2004).